A migração dos gnus

5 jan • NotasNenhum comentário em A migração dos gnus

Como é sabido, logo que passa o Ano-Novo, há uma forte migração de gnus das cidades grandes para o Litoral gaúcho e catarinense. Gnu tem dessas coisas, sai da cidade grande quando ela começa a esvaziar. Vai para o Litoral quando ele começa a encher.

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No final de fevereiro, a migração se inverte. É um comportamento um tanto estranho se você mostrar isso a um ET. Se o animal gnu precisa atravessar rios cheios de crocodilos na África, o gnu humano tem que passar pelas rodovias também perigosas. Tem muito gnu com carteira de motorista.

Como se vê nos documentários, alguns gnus ficam para atrás e preferem pastar em campos que começam a secar. Mas ainda assim, é só deles os que não gostam ou não podem migrar para outro destino. Então se acomodam como podem nas cidades de origem.

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A vantagem é que até ônibus que faz trajeto às vilas tem lugar de sobra, mesmo na hora do pique. Igualmente, restaurantes estão com pouco movimento, e você pode comer mais à vontade com mais atenção dos garçons. Problema: nem todos abrem. Não dá para ser feliz.

Assaltante de bermuda

Acredito que até os Homens Que Fazem Mal vão para as praias. Como os animais, alguns também ficam para trás e permanecem nos pastos vazios das cidades grandes.

A bem da verdade, Porto Alegre já foi bem mais perigosa em tempos de veraneio. Mas, mesmo assim, tem que conferir no hipotético retrovisor. Olhar para trás ou, pelo menos, fingir que está olhando para a retaguarda.

O Código de Trânsito Brasileiro diz que devemos olhar para o retrovisor de 10 em 10 segundos. O ser humano deveria fazer o mesmo quando caminha pelas calçadas, mormente quando ela está deserta.

Como tudo começou

A febre das praias catarinenses teve início nos anos 1970. Mas quem abriu os olhos antes disso foram os que cheiram bons negócios antes dos outros. E conto o caso como o caso foi.

Em 1966/1967, eu era assistente da gerência do Banco da Província, já falecido. Um amigo de um diretor do banco, de nome Danilo, era freguês no que se chamava de papagaio, empréstimo pessoa física com vencimento em 90 dias. Pagava-se um terço, Ele renovou por outros 60 ou 90 dias.

Como o Danilo tinha o pistolão do diretor, ele renovou pelo mesmo valor indefinidamente, até que um dia nem isso fez. Certa tarde, ele me procurou e me deu a real. Não tinha mais emprego. Em resumo, devo, não nego e não tenho como pagar.

– Podes executar a promissória, de nada adiante porque não tenho nenhum banco. 

Fiquei preocupado, afinal tínhamos uma relação de amizade.

– O que vais fazer para sobreviver?

– Vou para Santa Catarina, peguei uma representação de botas de borracha, falou.

As botas de borracha

Fiquei sem notícias por mais de ano. Um dia, ele me procurou. Tirou da pasta uma série de slides, daqueles em tubinhos de plástico, que se olha contra luz, mostrando fotos dele com pés em águas transparentes, areia alvas como Branca de Neve. Cada bota que ele vendia comprava terrenos a preços irrisórios. Nome de uma das praias: Garopaba.

– Esse vai ser o futuro, alemão, vai nessa que vais ganhar dinheiro.

Sem botas de borracha

Não fui porque não sabia vender botas de borracha, e o salário era baixo. Dez anos depois, já como jornalista, fui a Florianópolis.

Parei em um hotel de luxo na época, o Flops. Quando estava entrando, vi -com assombro – o Danilo saindo e embarcando em uma dessas Mercedes de xeique árabe.

Perguntei para a recepcionista se aquele não era o Danilo de tal. Era, disse ela, um dos homens mais ricos do estado.

A vida tem disso. Às vezes, o infortúnio gera oportunidades que nunca aconteceriam em circunstâncias normais. Portanto, eu não fiquei rico porque não sabia vender botas de borracha, por assim dizer. É mole?

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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