Jornal pra cachorro ler
Com a era digital, os “cachorreiros” têm cada vez mais dificuldade para encontrar jornais. A foto abaixo foi feita num sebo da Rua da Praia. Já numa banca de revistas defronte à Praça da Encol, uma sacola do Zaffari cheia de jornais custa 12 reais .
Um leitor que assina “em papel” o JC, Correio e ZH, fornece gratuitamente jornais para quatro cachorreiros. Mas está pensando em deixar de lado este ato beneficente.
De minha parte, posso assegurar que não é coisa nova. Em décadas passadas, papel d jornal era usado à guisa de sacola para embrulhar artigos de consumo, eis que não existam muitos supermercados como hoje. Os catadores de hoje, na época, recolhiam garrafas vazias e papelão, em boa parte como isolante térmico nos barracos. E, claro, como isolante térmico também para panelas.
A evolução do custo de vida
Uma das poucas vantagens da idade – para quem tem boa memória – é cotejar tempos passados com os atuais. Incluindo preços de produtos e serviços. Quando se diz que, até a revolução digital, tudo era mais barato, convém anotar que a escala tornou alguns até mais baratos.
Depois vieram as obrigações que não se tinha até os anos 1980. O condomínio, por exemplo. Até os anos 1960, o custo era barato, porque não havia portaria, segurança, vigia, câmeras de vigilância, porteiro eletrônico, serviços cujo valor encarece a taxa sobremaneira…
Os prédios comuns deixavam a porta de entrada aberta até uma determinada hora, entre 20h e 22h. Porteiro só em prédio de luxo. Não havia maiores preocupações com a segurança, então o que encarecia era a luz e água.
Entrada de cinema era mixaria, não que hoje sejam caras. Um PF cabia no orçamento de alguém de salário mínimo, hoje só se ele comer um por semana.
Copo e bicarbonato
O chope e a cerveja eram baratos. Uísque, bebida da moda nos anos 1970 e 1980, era bem mais caro. Nos 70, uma dose de uísque nacional comprava três a quatro chopes; estrangeiro, oito ou nove, no mínimo.
Então se bebia marcas-diabo, King’s Comander (argh!!!!), Drury’s, Old Eight e outros venenos. Mas era o que a casa oferecia.
Vinho era ruim. O melhorzinho gaúcho foi o Santa Úrsula. A maioria dos outros dava azia até em copo de bicarbonato, como dizia Osvaldo Aranha.
Espumante, ainda chamado champanhe, era feito com vinho branco ordinário. Creio que, hoje, a equação inverteu.
Com que roupa eu vou?
Roupa boa sempre foi cara, ponto. Mas o grande diferencial era o capricho na confecção. Duravam toda a vida e mais um pouco.
Era costume o irmão maior passar sapatos e roupas para o irmão menor, mesmo nas famílias mais abonadas. Sapatos bons, como Samello, Terra e Clark, não eram para o bico da classe média baixa.
Sapatos eternos
Sapatos injetados como os que se vende hoje não existiam, eram de couro ou couro, sem opções. No início dos anos 1960, um empresário de São Leopoldo criou um, de plástico, baratíssimo, mas desconfortável. Entretanto, tinha a vantagem de poder usar na chuva sem deformá-lo.
Sofreu boicote dos lojistas a mando dos grandes calçadistas. Quebrou. Depois vieram os injetados da Grendene. Mas essa já é outra história.
Tenho por mim que o fator que mais encarece produtos e serviços é a segurança, física ou digital., mais os custos do celular, computador etc.
Todo poder às massas
Uma boa medida para comparar épocas é o “tudo é 5”, que se repetia na virada do Plano Real, em 1993. Até a pandemia, “tudo é 50”. Agora, “tudo é 100”, com viés de “tudo é 200”. Um bom ala minuta de filé está chegando lá.
Há uns 20/25 anos, a RBS bancou um festival de massas trazendo chefs estrangeiros. Entrevistado pelo jornal Zero Hora, um deles disse que Porto Alegre era a única cidade do mundo em que se pagava 20 dólares por um prato de massa.