• Conto do otário

    Publicado por: • 20 jun • Publicado em: A Vida como ela foi

    A descoberta de uma quadrilha que ganhou rios de dinheiro aplicando o conto do bilhete premiado traz novamente à baila um antigo conceito: em terra que tem muito vigarista, também é grande o número de otários. Na realidade, acho que é isso mas não é bem isso. Em parte dos casos, a vítima queria tirar vantagem do pobre coitado que não sabia como receber o dinheiro do prêmio, mesmo achando que fez o bem.

    Em décadas passadas, o Centro Histórico pululava de vigaristinhas desse tipo e de golpes semelhantes. O mais famoso era acertar embaixo de qual de três dedais estava o feijão. Um dia, vi de perto como eles atuam. Confesso que os caras são rápidos pra caramba. Então perguntei a um oficial da BM por que eles não prendiam os homens.

    – Para fazer isso, eu teria que prender a vítima também. Jogo de dados é contravenção.

    Pois é disto que estávamos falando. Mas o que sempre me impressionou foi o fato de como pode uma pessoa deixar-se levar pela conversinha dos vigários gerais quando os jornais estavam cheios de relatos de casos assim. Tem que ser muito desligado do mundo para não captar cheiro de malandro no ar. Se bem que, hoje, o povo compra artigos de terceira e última qualidade sabendo que é friagem, falsificação grosseira.

    Também temos falsas bolsas Vuitton e produtos Cartier mais frios que rabo de pinguim mostrados por gente fina. De duas uma: compram mesmo sabendo que é fake, ou não sabem porque nunca se deram ao trabalho de se informar como detectar falsidades.

    É como dólar falso. Ninguém sabe ao certo, mas há bilhões ou centenas de bilhões de verdinhas frias circulando em todo mundo sem que o dono saiba o que realmente são. Enquanto não souberem, todo mundo paga e recebe. E vivem felizes para sempre.

    Imagem: Freepik

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  • Vou lhe dizer um grande segredo, meu caro. Não espere o juízo final. Ele realiza-se todos os dias.

    • Albert Camus •

  • A Arena em Moscou

    Publicado por: • 19 jun • Publicado em: A Vida como ela foi

    Nas Olimpíadas de Moscou de 1980, aquela do ursinho Misha vertendo uma lágrima no final dos jogos, entre a comitiva de jornalistas estava o Paulo Sant’Ana. Durante uma escala, parece que na Itália, ele comprou dólares na rua, um pecado mortal até no Vaticano. Quando chegaram em Moscou, todos trataram de trocar dólares por rublos em um guichê ao lado da recepção do hotel. Sant’Ana, é bom lembrar, tinha sido vereador pela Arena nos anos 1970, que era o partido do governo no tempos do regime militar.

    Bem do jeito dele, Sant’Ana nem deu pelota para a fila que se formava e a furou. Quando entregou os dólares comprados na viagem, a russa parruda que fazia o câmbio olhou discretamente para o lado. Em milissegundos apareceram dois KGBs da vida e conduziram o Paulo pelos cotovelos até uma sala contígua.

    Os demais jornalistas olhavam divertidos a cena, pois sabiam que não aconteceria nada com o gaúcho a não ser perder os dólares frios. Quando estavam na porta da tal sala, o jornalista e treinador João Saldanha, conhecido por simpatizar com o PCB, botou as mãos em concha e gritou.

    – Pode prender porque ele é da Arena!

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  • O voo do Beija-Flor

    Publicado por: • 19 jun • Publicado em: Caso do Dia, Notas

    Publiquei semana passada que o Neguinho da Beija-Flor anunciou que iria se mudar de mala e cuia para Portugal, cansado que estava da violência no Rio de Janeiro. Isso dito por alguém que nasceu no morro, vive no morro e é festejado pelo morro pode dar bem a dimensão de como andam as coisas na terra do Cristo Corcovado.

    Vai e volta

    Um leitor colocou em dúvida se o carioca Neguinho realmente aguenta ficar longe do Brasil, do samba, das escolas e do Carnaval. Bem, ele falou que, no Carnaval, vem de volta e vai de volta em seguida. Olha, eu não conheço o cara, mas entendo o seu sentimento, ainda mais que ele já não é mais guri e está numa idade em que tudo parece muito assustador. Eu mesmo tenho dito que, se tivesse grana, iria para lá. Mas isso deve ser entendido como intenção de voto.

    O alemão de Portugal

    Porém, e sempre tem um, o leitor tem lá um pouco de razão quando se olha o perfil vida e obra de Neguinho da Beija-Flor. E conto um causo para ilustrar. Em 1985, estive em várias cidades da Alemanha, e uma ficava no Vele do Ruhr, se chamava Neuss. O dono do pequeno hotel era também o barman. Durante três noites, conversamos sobre Brasil usos e costumes. Facilitava a conversa o fato de ele ser casado com uma portuguesa. Na última noite, ele contou o caso de um grande amigo dele que era casado com uma carioca, sambista de escola.

    O sol por testemunha

    No início, disse ele, o casal ia muito bem – foi amor à primeira vista, quando o alemão visitara o Rio e foi a um ensaio de escola de samba e a conheceu. Era do morro. Bem, tudo IA bem até que se passaram alguns meses, oito ou nove. De repente, ela começou a ficar sorumbática, deprimida, queixava-se da falta de sol, da caipirinha, dos amigos, da praia, da luz e do calor. O que eu achava, será que era coisa passageira?

    Sem final feliz

    Fiquei com pena do amigo, mas tive que dar a real. Falei para ele dizer para o amigo que, mesmo à distância, eu achava que o casório estava destinado ao fracasso. Você não substitui um estado de alma por uma cidade fria, pequena e sem atrativos e trancada todo dia em casa. Ficou de falar com ele. Era suspeita dele também. Não sei o epílogo, mas não é difícil adivinhar o desfecho.

    Ausência de fatos…

    Foi a ausência de fatos extra Copa que tornou anêmicas as edições dos jornais ou foi o deslocamento de um exército de jornalistas de outras editorias para a cobertura lá e cá? Tem uma máxima de redação que diz “notícia não tira férias”.

    …ou ausência de jornalistas?

    No caso do Brasil, até tira um pouco. Entretanto, não a esse ponto. Vale o mesmo para a Lava Jato. A magreza na cobertura do dia a dia também deve-se à carência de repórteres pelo emagrecimento das redações nos últimos dois ou três anos. A diminuição da receita publicitária forçou as demissões. Atingiu mais quem ganhava melhor, por sinal. Então, perdemos em quantidade e qualidade. Como eu sempre digo, não estamos contando a história como ela é.

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  • São quase 30 milhões

    Foto: Claiton Dornelles/JC

    Publicado por: • 19 jun • Publicado em: Artigos

    Aproximadamente 28.788.480. Não, não é saldo na conta bancária. É o número de caracteres escritos pelo Fernando Albrecht na Página 3 do Jornal do Comércio, até ontem, quando completou 21 anos de casa. Modesto, o piá de São Vendelino não quis colocar uma linha aqui no blog sobre as homenagens recebidas pelo JC ou pela Coletiva.Net – leia aqui. Mas o bom de ser assessora dele é isso: teimar com o chefe e publicar este marco importante não só para ele, mas para os leitores e colegas de profissão. Podem ficar com inveja.

    Neste ano, Albrecht, também comemora 50 anos atuando na comunicação. Em setembro de 1968, começou na Redação da ZH, quando esta ainda se localizava na Sete de Setembro – onde hoje é a garagem Rex. O proprietário do jornal era Ary de Carvalho, e Fernando só chegou à redação porque o amigo e colega de faculdade Ademar Vargas de Freitas falou de uma vaga para a reportagem policial. “Boca braba na época”, como já me descreveu o próprio Albrecht numa noite em que fomos saborear a pizza na panela do Pedrini. Podem ficar com inveja de novo.

    Outro dia, ele me contou que fazia faculdade no turno da manhã, trabalhava no Banco da Província, entre 12h30min e 19h. Logo após às 23h, tinha de estar na redação da ZH, a fim de cobrir os crimes da madrugada. Para comer e dormir, pouco mais de três horas. No final de semana, o plantão era dobrado. E você pensando que, atualmente, trabalha demais, na redação “multimídia”, onde tem de se virar nos 30, né? Pois Albrecht garante que aquele foi um dos períodos mais felizes da sua vida.

    Fernandinho, como eu gosto de chamá-lo, recebeu convite do Maurício Sirotsky para produzir e coordenar o Campo & Lavoura na TV Gaúcha, em 1975. Vinha a ser o primeiro programa de agronegócios da TV Brasileira, depois copiado pela Globo. Ele passou por agências de publicidade, jornais, rádios, site de notícias. É ganhador de centenas de prêmios de Jornalismo, e acabou dando nome a um troféu do Prêmio Press.

    Parabéns, guri, pelos 21 anos de Página 3 de JC, por seres esse baita profissional, amigo, cavocador de um bom furo, teres ética, e, como resultado, conquistado tanto respeito. Tenho orgulho de ser tua amiga. Por favor, não me demita pela minha teimosia. É uma baita admiração.

    maioridade Fernando Albrecht no JC

    Anúncio publicado ontem pelo Jornal do Comércio

    Anúncio publicado ontem pelo Jornal do Comércio

    Foto: Claiton Dornelles

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