Ourives das palavras
Mais de meio século a serviço das palavras com opinião, o editorialista Roberto Brenol de Andrade deixa a ativa do JC e vai para a reserva. Na sexta- feira passada, direção e funcionários o homenagearam.
Embora ele tenha alguns anos de idade a mais, começamos nos idos de 1960 a nobre profissão de ser ourives das palavrinhas, hoje um tanto quanto descuidada. E cursamos jornalismo juntos na mesma época.
Antes, em 1966, quando era Secretário da Gerência do Banco da Província, liberei empréstimos de curto prazo a ele. Brinco até hoje que salvei a vida financeira dele. Pelo menos, o Brenol pagou tudo direitinho.
Nos quase 26 anos de JC, 54 de jornalismo mais outros oito anos de outras profissões, sempre fomos próximos embora fisicamente separados, sempre conversamos sobre os tempos iniciais, em que a Capital tinha menos de 50 mil automóveis.
As enormes linotipos lançavam vapores de a chumbo derretido e o matraquear das das máquinas de escrever tornavam redação um doce caos. O repórter percorria a cidade não raro pendurado nas quatro entradas dos bondes como cacho de uvas na parreira.
Quantas vezes lembramos os tempos em que palavras erradas não podiam ser deletadas como hoje nas laudas, e como a arte de escrever exigia atenção redobrada. Vivemos crises sem conta nesse nosso Brasil, que nos atemorizavam porque estamos muito próximos delas.
Como no filme Zulu daqueles anos, quando um assustado soldado inglês viu milhares de zulus em direção à sua patrulha tendo ao lado de um imperturbável sargento bigodudo britânico.
– Por que nós, sargento?
– Porque estamos aqui.
É. Nós também estávamos aqui.