O garçom dos passarinhos
No início dos nos 1970, a ADVB começou a destacar os melhores vendedores para premiá-los, aliás fazendo jus ao V da sigla. Época em que a instituição era dirigida por Gunther Staub. Foi a reunião-almoço mais disputada daqueles tempos, realizadas no hotel Plazinha. A entrada era quase sempre coquetel de camarão, com pedaços do crustáceo no molho rosé e dois grandes pendurados na beirada do copo. Sucesso absoluto.
Mais ao menos na mesma época, a Nestlé e a Dínamo de Cafe Solúvel, de Teresópolis, RJ, travavam batalha para conquistar mercado. A empresa suíça era dona do campinho, mas a Dínamo incomodava por obra do seu diretor no Rio Grande do Sul, um vendedor nato chamado Nei Morgado. Ele contratou Paixão Côrtes para fazer o comercial de TV “Chega de café de chaleira” para mostrar as vantagens do solúvel.
Foi um escândalo. Um grupo de gaúchos exaltados foi ao Palácio pedir ao governador Euclides Triches a expulsão do folclorista, que já tinha provado que café de chaleira tinha origem turca, assim como a bombacha, que o fundamentalismo guasca achava ser invenção gaudéria. No galpão, despeja-se o pó do café na água fervente e colocava-se um tição, que faz afundar a borra. Adicionar um pouco de água gelada faz o mesmo efeito.
Naquele tempo, fazia sucesso nacional o publicitário paulista Neil Ferreira, que fez concorrida palestra em Porto Alegre. Na hora das perguntas, Morgado perguntou qual seria sua fórmula para diminuir a resistência das donas-de-casa ao café solúvel. Neil pensou um pouco, depois deu sua melhor tacada.
– Se eu soubesse não a revelaria aqui, venderia a fórmula para a Nestlé.
O carioca Nei também não era fácil. Usava o cabelo à moda escovinha. Quando estacionava o carro em lugar proibido se não houvesse vaga legal, nunca um brigadiano o multou – a Brigada cuidava do trânsito à época. Eram os anos do regime militar e, por algum motivo, ele tinha pinta de coronel, graças ao corte militar. Na dúvida, o PM deixava por isso mesmo.
Na lista dos melhores vendedores eu incluiria um juiz. Seu filho frequentava o Bob’s Bar, na Cristóvão Colombo, 36, cujo garçom vendia desde estojos de maquiagem a perfumes e até passarinhos em gaiola. Sabedor que o pai do freguês gostava de passarinhos, foi ao seu apartamento não longe dali vender um.
Não só não vendeu como comprou dois do juiz.