Da bomba ao hospício

10 jul • A Vida como ela foiNenhum comentário em Da bomba ao hospício

Entre as lembranças da Porto Alegre dos anos 1960 e 1970, incluem-se os jornais diários que tínhamos. Desapareceram na voragem do tempo o Diário de Notícias, Jornal do Dia (católico), Folha da Tarde e Folha da Manhã, estes últimos da velha Caldas Junior de Breno Caldas. Em meus 55 anos de jornalismo nunca vi um grupo de comunicação desaparecer tão rápido.    

Cada um deles tem suas histórias, muitas que vivi. Por exemplo, quando desapareceu a Última Hora, que deu lugar à Zero Hora. Então do jornalista Ary de Carvalho (até dezembro de 1969), a redação ficava na Sete de Setembro com oficina na Cidade Baixa.

O Jornal do Dia cedeu mesas, cadeiras e parte das máquinas de escrever para Ary de Carvalho, um notável jornalista que voltou ao Rio de Janeiro e se deu muito bem criando outros jornais. Ary tinha enorme respeito por seus jornalistas, pagando horas extras e outros adicionais  para melhorar o salário deles.

A Caldas Júnior imperava, tratava a Zero com um indisfarçável desprezo. Mas era um bom jornal com uma dezena de colunistas conhecidos. O foco era a cidade e a reportagem policial.

Interessante  observar que, naqueles anos, não existiam editorias de Economia, que surgiram no vácuo deixado pela magreza da cobertura política devido ao regime militar. As matérias eram esparsas.   

Como repórter da madrugada, vivi situações de perigo que incluíram um  tiro e um coquetel molotov jogado na viatura onde estávamos eu, o fotógrafo Waldomiro Soares e o motorista Luismar. Foi no final de 1968, às 6h da manhã na esquina da Sete de Setembro com a  Uruguai.

Quem jogou foi um meliante chamado Mina Velha a mando de um bandido maior. Mas era do jogo, paciência.  

Um episodio cômico envolveu um repórter político que cobria o Palácio Piratini e Assembleia para o Diário de Notícias. Bom no ramo, ruim na arte de escrever. Alegando a grande distância até a redação, na rua São Pedro, passava matéria por telefone.

Um dia o editor chefe, Celito de Grandi, explodiu. Não tem desculpa, vais bater a matéria na redação.   

Emburrado, o repórter foi à redação, sentou-se à mesa e, na hora de datilografar, perguntou se hospício eram com H ou sem.       

– Já te disse, tem um amansa-burro na tua mesa, consulta! – falou Celito, com sua voz mansa.

No outro dia, o jornal publicou uma matéria que começava assim:     

Sob os hospícios da Primeira Dama do Estado…

https://www.brde.com.br/

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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