A máquina do tempo 

24 mar • NotasNenhum comentário em A máquina do tempo 

No aniversário dos 250 anos de Porto Alegre é inevitável que veteranos como eu lembrem com saudade da cidade antiga, de quando estávamos na flor da idade, a vida sorria e o futuro era largo e amplo. Então volto 50 anos e a máquina do tempo me joga para 1972. Como no livro, depois em filmes, caio em um local que não pude escolher. Por acaso, na Rua da Praia, bem em frente ao Rihan, hoje Panvel do Calçadão.

Hoje seria lancheria/cafeteria, ponto de encontro de todas as pessoas interessantes de Porto Alegre. Chegou a vender quatro mil cafezinhos por dia. Um fenômeno.

Entrei, comprei a ficha e fiquei ouvindo a conversa de Paulo Brossard com Pedro Simon. Falavam sobre eleições. Na saída, esbarrei com uma figura folclórica, o Homem dos Cachos, com uma maleta de vidro onde se viam cédulas de cruzeiro, moeda da época.

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Caminhei uma quadra e entrei na Padaria Matheus, defronte ao miolo da Praça da Alfândega, ou Praça Senador Florêncio. Na esquina com a Ladeira, floreiras grandes. Pedi um sanduíche de pernil fatiado na hora com molho extraordinário, o mesmo do cachorro quente.

Para acompanhar, uma batida (vitamina) de abacate. Kid Berloque, o dono, gesticulava e fazia chacoalhar as pulseiras e correntes de ouro do pescoço. Reclamava do preço da farinha de trigo. Fiquei tentado a dizer que, 50 anos depois, teríamos o mesmo problema. Mas pelas regras da máquina do tempo isso quebraria o encanto.

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Sentada em um banco, a Maria Chorona se debulhava em lágrimas. Ninguém sabia o motivo.

Segui em direção à Borges de Medeiros. As meninas  da Loja Sloper cochichavam confidências sobre seus namorados vestidas de saia plissada e blusa, ambas pudicas. A minissaia lançada em 1962 pela estilista Mary Quant, não era unanimidade. O pai ficava brabo.

Adiante, na Uruguai, hóspedes do Hotel Lá Porta entravam e saíam. Não existiam camelôs na Andradas, apenas poucos ambulantes que ambulavam, não os de hoje, que são fixos.

Na esquina com a Travessa Acylino de Carvalho, conhecido como Beco do Mijo, vejo o Xerife, com uma grande estrela de papelão colada na camisa. Severo, parecia um quase de verdade que escapou do faroeste selvagem também em uma máquina do tempo. Tivesse uma Colt 44 no coldre,  seria perfeito.

A loja da Varig, uma das tantas que existiam no Centro, , ficava na esquina da Borges de Medeiros. Sorri ao lembrar de uma frase do jornalista gaúcho Justino Martins, da revista Manchete: o sonho do gaúcho é ser cavalo ou avião da Varig.

AMANHÃ a máquina do tempo volta a funcionar. Terminou a bateria.

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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