Questão de antena
Anos 1980, uma sexta-feira. Eu estava quase baixando o Informe Especial, a página 3 da Zero Hora, quando o diretor de redação assomou à porta da sua sala e fez aquele sinal com dedo indicador virado para baixo, me chamando. O Lauro adorava me deixar preso na redação até noite alta.
– Não sai sem falar comigo!
Era uma ordem. E repetida com frequência. Em menos de meia hora, finalizei o texto e mandei para a diagramação. O Jorginho fez o seu serviço bem rápido, de maneira que eu podia ir embora.
– Não sai sem falar comigo! – reordenou o Lauro.
Para usar uma frase dos romances, tamborilei os dedos na mesa. Ê saco! Passou uma hora, e o cara me prendendo. Justo quando eu ia para o famoso dá ou desce, ele me chamou.
– Seguinte. Bota uma nota advertindo que amanhã, à meia noite, começa o horário de verão. Sempre tem os desligados que não se flagram no óbvio.
– Mas Lauro, já tá baixada a página, vou ter que reabri-la!
– Faça isso.
Butz a bariu, como dizem os palestinos das lojas do Centro. Troquei a nota rápido, mas para diagramar de novo levou um tempão. No domingo, fechei a página e ao sair do prédio vi que o enorme relógio do prédio ainda estava com o horário antigo. Voltei para a minha vingança.
– Lauro, olha só. O nosso relógio não foi mudado para o horário de verão. E arrematei:
– Sempre existem os desligados que não são antenados, não é mesmo?
Sai correndo para ele não dizer “não sai sem falar comigo” de novo.