• É parte da cura o desejo de ser curado.

    • Sêneca •

  • A voz da infância

    Publicado por: • 15 mar • Publicado em: A Vida como ela foi, Direto do Túnel do Tempo

          A Câmara dos Deputados aprovou, em caráter definitivo, a flexibilização da Voz do Brasil, terminando com o horário sagrado das 19h às 20h. Hoje ele é uma chatice, prestando-se mais para arroubos oratórios de suas excelências. Até os anos em que a merdolência se apropriou progressivamente do mundo, início dos anos 1970, e antes da internet e redes sociais e até do fax, a Voz do Brasil era um programa informativo de verdade. Digamos que um release das atividades dos três poderes.

          Quando era pequeno, em São Vendelino, final dos anos 1940, tínhamos em casa um rádio da marca Mende, que era muito bom nas ondas curtas, que hoje ninguém sabe o que é. No inverno, ele ficava na cozinha para aproveitar o calor do forno a lenha. Eu e meu irmão Paulo Cristiano chegávamos o mais perto possível do aparelho para ouvir as Aventuras do Capitão Atlas, na Rádio Tupy, do Rio de Janeiro. Quando ele terminava, entrava a Voz do Brasil.

    A sintonia escapava amiúde e, quase sempre, no momento crítico do seriado do Capitão Atlas. Murphy morava em São Vendelino na época. Daria tudo para voltar aos meus oito anos e sentar, com meu irmão Paulo, com a orelha grudada no rádio Mende para ouvir a Voz do Brasil que fosse. Ouvir o início da Voz do Brasil, com a abertura da ópera O Guarani, de Carlos Gomes, tendo às costas o calorzinho do fogão e, ao lado dele, minha mãe fazendo as cucas e doces que ninguém mais no mundo sabia fazer.

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  • Diário de uma vida nova

    Publicado por: • 14 mar • Publicado em: Caso do Dia

    Dia 2, terça-feira. 14 de março.

    Borzeguins ao leito

    Neste segundo dia da contagem regressiva (no bom sentido) para minha cirurgia, que será feita no início da semana que vem, sigo contando o dia a dia e a hora a hora dos preparativos para o grande evento – ou vais me dizer que não é um? Não só festa que se enquadra nesta definição. Por exemplo, se você tiver que ir ao banheiro e não der tempo para chegar nele, acontecerá um grande evento. Esclareço que não é meu caso. Falo em tese, então não me venham com aleivosias nem de borzeguins ao leito.

    Nada de novo no front

    Não há novidades hoje sobre o diagnóstico e um outro exame que fiz (biópsia). Este exame é mais ou menos como cair na malha fina. Às vezes, você tem que pagar mais, às vezes, foi apenas um mal-entendido. Gostaria muito que fosse, mas o doutor Daniel Azambuja já me advertiu que o caranguejo se instalou na saída de serviço do meu corpo. O abominável é que nem tatu, não pode ver toca que entra. Se não tem, ele escava uma. Para ele, é uma espécie de Minha Casa Minha Vida.

    Carona de unha

    Como a unha do dedão do pé está fazendo upgrade para se tornar unha encravada, quem sabe peço aos médicos que farão minha cirurgia se não podem também dar um jeito na danada?

    O terremoto

    Na Escala Richter que mede apenas intensidade dos terremotos, que se diz que vai até 9, mas pode ir muito além, o impacto do diagnóstico foi um grau 8, digamos. Mas, como em todo o sismo, sobrevêm os tremores secundários, que podem ser de bom tamanho. É o caso. Mas sigo inarredável na minha proposta de tratar a doença com meu jeito de ser, que é insistir no humor.

    A vida continua

    Não sinto dor, me alimento normalmente, o apetite sempre é grande, continuo caminhando 5 Km na esteira e pretendo ir na academia até um dia antes de vestir aquele pijama que te deixa de bunda de fora. Não deixa de ser um paradoxo, o pijama hospitalar protege meu escalão avançado e deixa a retaguarda a descoberto.

    A curva do reto

    Estou pensando em denunciar o câncer no Tribunal Internacional de Genebra por violação dos direitos humanos. E também quero que a Organização Mundial da Saúde corrija um grave erro: o reto é curvo. É reto só um pouquinho.

    Segunda época

    Baixo ao hospital no domingo, 18, cirurgia um ou dois dias depois. Farei exames complementares. Fico com a mesma incômoda sensação que tive no colégio: ficar em segunda época, hoje chamada de recuperação. Parece que alunos não podem mais ser reprovados, o que é um convite ao um futuro demente. O Brasil faz força para caminhar para trás.

    Eu no satélite

    Estudo divulgado recentemente indica que o mercado de Observação da Terra pode alcançar até 15 bilhões de euros dentro de 10 anos. E que o tamanho do mercado global de imageamento (!)aéreo deverá chegar a 3,2 bilhões de Euros em 2023. Já os drones têm potencial para chegar a 127 bilhões de Dólares. De repente, um satélite capta as imagens da minha cirurgia. Imagina, eu no You Tube para todo o mundo!

    Pensando bem, melhor não.

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  • A Vida Como Ela Foi

    Publicado por: • 14 mar • Publicado em: A Vida como ela foi

    O avental da Independência

         Falar em pijama de hospital. Certa vez, o meu grande e falecido amigo Melchiades Stricher estava internado na Beneficência Portuguesa de Porto Alegre convalescendo de uma cirurgia para desentupir a carótida. Como ele fazia esse procedimento pelo menos uma vez por ano, já estava acostumado. Levava na boa. Mas sempre no Hospital Ernesto Dornelles, que, desta vez, não tinha vaga. Coloraram-no com outro paciente no quarto, que estava em estado crítico.

         Se havia uma coisa que o Melchíades “Nada Pessoal” Stricher detestava era ver paciente sofrendo ao seu lado. Era madrugada alta e, de repente, o colega piorou a olhos vistos. Em pânico, Mel acionou a campainha que alertava a enfermagem. Como demoraram, ele não teve dúvida: saiu para a rua com aquela vestimenta esvoaçando e se plantou no meio da avenida Independência acenando para os táxis que passavam. Levou horas até um parar.

          Mel deu seu endereço residencial. No trajeto, o taxista comentou a causa óbvia dos colegas não pararem.

        – Olha, você vai me desculpar, mas com esse avental aberto atrás, com a bunda de fora, certamente, foi confundido por um louco que fugiu dos hospício.

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  • Num restaurante, sempre procure mesa perto do garçom.

    • Provérbio judaico •