Pobre, mas limpinho
Eu curto muito o jeito que a vila fala. Peguei essa atração nos longínquos anos 1968/69, quando fui repórter da madrugada da ZH. Falava tanto a língua da granfinagem quanto a do povo dos casebres. Fazia parte da reportagem policial.
Com alguma frequência, era convidado para um carreteiro ou galinhada. A granfinagem comia estrogonofe, um guisadinho metido a besta, como dizíamos. Hoje qualquer pé-sujo oferece.
Galinhada era feita de galinha velha cozinhando horas e horas em panela de ferro para amaciar a carne da penosa. Comida de rico era na panela de pressão. Tive algumas namoradas efêmeras no alto mundo. Foi muito bom.
Galinha era cara naqueles verdes anos. Tanto que se dizia que pobre só comia galinha quando um dos dois estava doente, ela ou canja de hospital. Nesta, a galinha passava voando por cima da panela.
Bom era galinhada do povão – não confundir com frango com arroz.
No Mato Sampaio, hoje vila Bom Jesus, comi um suculento mocotó. A cozinheira, a mulher do motorista da viatura do jornal, me disse que estava triste, e explicou.
– Fui roubada do meu relógio…
Observem a construção da frase. Faz o drama ser muito maior. Triste ou não, o mocotó estava sublime, com ingredientes limpinhos.
Fiz as contas, mas meu salário não dava para dar um para ela. Foi no tempo de dar corda, não dos baratos de quartzo que só vieram muitos anos depois.
O barraco também era limpinho. Pequeno, mas acolhedor. Duas árvores, uma na frente e uma laranjeira no quintal. O povo faz florestamento de árvores frutíferas cuspindo sementes.