O tempo que mata
O que resta depois de uma certa idade? Lembranças, essa parte guardada na nossa memória que costuma ser paradoxal.
Os fatos alegres do passado não nos alegram hoje. Mas os ruins voltam a doer como doeram nos velhos tempos. O que pode acontecer é desencadear sorrisos tímidos e fugazes, na melhor das hipóteses.
Tenho uma amiga na Alemanha, que saiu do Brasil há 50 anos. Falamo-nos pelo WhatsApp.
Dançamos nos mesmos bailes, nas mesmas reuniões dançantes, vimos as mesmas paisagens, tivemos os mesmos amigos e amigas, sentimos os mesmos cheiros até dos perfumes da época. Rimos muito e choramos quando Aquela Que Nunca Falha levou alguém das nossas relações.
Passadas todas estas décadas continuamos a reviver instantes fugazes de quase namoro. Lembramos dos nossos pais, dos verões tórridos e dos invernos inclementes. Botamos a conversa em dia, falamos do hoje.
Mas no fim da conversa, fica uma sensação que queremos de volta o tempo passado, mesmo sabendo que isso é impossível. Quando falamos do presente, somos quase estranhos.
O tempo não só nos rouba a mocidade, também nos rouba a esperança. Felizes dos que não têm memória passada.