O cobertor que virou fuzil

30 dez • A Vida como ela foiNenhum comentário em O cobertor que virou fuzil

Quando assumiu como governador, em 2000, Olívio Dutra disse que não usaria a ala residencial do Palácio Piratini e continuaria morando no seu modesto apartamento da Assis Brasil. Rendeu-se lá pelas tantas do mandato.

Jair Soares jurava que ouvia as vozes dos famosos fantasmas durante a madrugada. Synval Guazzelli também se referia a eles, contava seu assessor de imprensa, que era por ele chamado “Flecha Ligeira”, por motivos óbvios.    

O Palácio Piratini tem tantas histórias que, certamente, uma delas teria a ver comigo. Em meados dos anos 60, após a Revolução de 1964, pouco antes de entrar na Zero Hora, eu morava na Duque de Caxias, altura do Alto da Bronze. Trabalhava no Banco da Província e fazia Jornalismo na Ufrgs. Uma eme de dar dó.   

Bateu um inverno rigoroso, o pior da década. E eu não tinha um mísero cobertor digno deste nome. Uma noite, fui jantar no apartamento de uma amiga minha, em um prédio também na Duque, esquina com a Marechal Floriano. Sabedora da situação, até porque ela já tinha passado muito frio na minha humilde morada durante um combate de Eros, me deu um cobertor de primeiro mundo. 

Embrulhei o dito cujo em rolo e me fui satisfeito para casa. Era alta madrugada, chovendo. Quando passei na frente do Palácio, o brigadiano que montava guarda me parou, apontando sua arma. E botou o dedo no cobertor.    

– Desenrola!  

Ainda tentei argumentar, dobrando o cobertor para mostrar que não tinha nada por dentro.     

– Desenrola, já falei!

Certamente achava que o cobertor escondia algum fuzil. E tive que desenrolá-lo na calçada, encharcando meu rico presente por causa de um guardinha metido a besta.

Pra quê? Pra nada, como dizem os versos do poeta pernambucano Ascenso Ferreira sobre as bravatas dos gaúchos (Lá vem os gaúchos em louca cavalgada/Pra que?/Pra nada…).

https://www.brde.com.br/

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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