Transfusão de vinho
O Baiano era um quebrador de galhos para os integrantes da mesa da diretoria do Bar e Rotisserie Pelotense, na rua Riachuelo entre Borges de Medeiros e Praça da Matriz. Buscava documentos, pagava contas diversas, ia ao banco descontar cheque, fazia compras no Mercado Público, buscava até exame de laboratório para que a turma das Mesa Um pudesse fazer libações sem ter que fazer essas desagradáveis tarefas. Pequeno e mirrado, já passado dos 60 anos, o Baiano caminhava em câmera lenta, mas nunca desapontou ninguém. Tiro dado, jacu deitado.
Bebia-se muito vinho alemão naqueles anos 1970. Os mais exigentes pediam o branco Prädikatswein, que exige altas requisitos de qualidade. Baiano disse à roda que achara um despachante que comprava o produto de marinheiros de navios alemães, claro que a um custo exorbitante. Bem, fazer o quê. Davam o dinheiro e lá se ia o cara rumo ao Cais do Porto a passos de tartaruga com artrose.
Certa sexta-feira, o fact totum veio à roda contar que o despachante tinha quatro garrafas desse vinho especial, que era pegar ou largar. Vá e compre, disseram. Passada mais de hora e meia, Baiano telefonou para o proprietário da Pelotense, João Mariano, para que avisasse a turma que encontrara coisa melhor, mas a um custo bem mais alto. Que venga el toro.
Enquanto isso, alguém atravessou a rua onde ficava a loja Secos & Molhados do Supermercado Real, o precursor das lojas AM-PM de hoje, criação do executivo Chico Pinedo Kasper. Foi quando ele viu, bem no fundo da loja, o Baiano sobraçando quatro garrafas do vinho comum e barato Liebfraumilch.
Nosso bom homem transportou o Cais do Porto para a rua Riachuelo. Em algum lugar ele faria a transfusão.