Os bois que bebem
Ouvi, ó animais e expositores da Expointer, nossa maior feira, os sinais do Armagedom já estão presentes. São tempos de vaca não reconhecer bezerro.
O povo que gosta de bichos vai lá não tanto para vê-los, mas para encher a cara nos trocentos bares que ficam abertos até de madrugada. É longe, é frio pra caramba. Mas quem liga?
Depois de umas outras, os porristas nem mesmo sabem mais porque estão lá. Alguns pensam que estão vendo bichos e tratam de beber menos, até a próxima feira.
O Natal do boi
A peonada que cuida dos touros, bois, vacas e primos distantes da Arca de Noé são os únicos que realmente curtem a festa. É o carnaval deles. Porque, no resto do ano, estão na lida do campo com direito à diversão nas bailantas dos CTGs. Onde, de vez em quando, facas de churrasco brilham à luz do lampião ou do luar, fotografia que não raro acaba em sangue.
Gente rude da cidade, vocês não sabem nada do campo, suas alegrias e tristezas afiadas com pedra de amolar da monotonia. E quando a feira vem, eles ficam alvoroçados. Semanas antes eles têm a insônia de uma criança na véspera da noite do Natal. O brinquedo de bovino é pasto sempre verde e suculento e uma boa porção de sal no cocho.
Comer, beber, dormir
Uma vez instalados nas cocheiras e baias, escovam os animais, que podem ser do patrão, mas foram eles que os viram crescer. Como raparigas que se enfeitam para deleite dos outros, eles curtem essas manobras de limpeza e conservação de animais possantes.
É a glória deles, mesmo que o dinheiro seja do patrão. Não faz mal, eles viram o olhar de admiração da meninada e seus pais com a imponência dos seus pupilos. Não é como no carnaval, que termina na quarta-feira, a feira dura sete dias.
Aqui se brilha, aqui se paga
Então é a volta dos animais estressados pela viagem para a fazenda ou cabanha em que nasceram, foram cuidados e escovados sob olhares atentos a qualquer alteração do corpo e da alma. Sim, gado tem alma. Eles sonham. Não com as luzes da cidade, mas com pasto verde banhado pela luz do luar, onde de longe se ouviu um quero-quero avisando que esta terra tem dono.
Sexo pago
Essa é a beleza da coisa. O boi, o touro, as vacas, elas sabem o que é bom para a tosse. São animais premiados que passarão o resto da vida a fazer sexo e procriar. Não há anticoncepcional para eles. Mas dão graças ao deus dos bovinos por não precisarem ir ao matadouro e depois serem transformados em filés e, horror, suas tripas para um suculento mocotó.
O mundo do mar no meio
A sociedade dos animais premiados e educados para parir filhos da melhor linhagem. Enquanto isso, touros cheios de testosterona ficam frustrados por não terem sexo ao vivo e a cores. O destino deles é doar sêmen. Algum humano solitário deve ter sussurrado para eles “eu te entendo, também fico no seco, e nem vaca mecânica para ejacular tenho”.
A função da Humanidade é a obrigação de crescer e multiplicar, hábito que os humanos praticam tanto que alguns pegaram nojo. De certa maneira, os touros são mais felizes que os humanos. Pelo menos não precisam pagar pensão, não pegam Aids e o plano de saúde deles cobre qualquer doença. Ainda mais sendo premiado aqui na Expointer ou no mundo que tem mar no meio.
O seu ao seu dono
O Armagedon? Mais dia menos dia, os humanos serão admirados na Exposição dos Animais. Escovados, cuidados e alimentados por macacos inteligentes, a serviço dos macacos-proprietários. Serão peões do Planeta dos Macacos porque de guerra em guerra, de destruição em destruição, quem não morreu virou animal.
Colunistas Sul
Na última sexta-feira, 26, a Escala foi reconhecida pelo Prêmio Colunistas Sul 2021/2022 como a Agência de Comunicação do Ano. A premiação é oferecida pela Associação Brasileira dos Colunistas de Marketing e Propaganda (Abracomp) desde 1967 e reconhece os principais trabalhos de Comunicação de Marketing de empresas e profissionais brasileiros.