No tempo do Osca

22 mar • NotasNenhum comentário em No tempo do Osca

Nos anos 1970, criou-se uma expressão de origem desconhecida para dizer que a situação era terrível, tenebrosa. A situação está osca, dizíamos, sem ter a mínima ideia do que vinha a ser “osca”. Mas funcionava. O colunista e comentarista de rádio e TV Lauro Quadros era o mais fiel cliente dela. Era osca pra cá e pra lá. Hoje, a situação é terrivelmente osca, e bota osca nisso.

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Corações em frangalhos

Saí sábado de manhã a caminhar, como de hábito, e, como de hábito, auscultei o pensamento e o coração de pequenos obreiros, donos e funcionários de operações como padarias, lancherias e bufês. Rapaz, era para ver o desespero deles ao tomar conhecimento que um juiz havia deferido liminar suspendendo a reabertura limitada desse ramo de comércio, marcado para hoje.

Todos com quem falei já tinham apalavrado a presença de funcionários para hoje, todos já tinham reforçado ou encomendado reforço nos estoques de comida perecível. Uma delas chorava com o filho pequeno no colo. Senti-me muito mal por ser o portador das más notícias, muito mal mesmo.

Menos mal que ontem um desembargador anulou a decisão do juiz de primeira instância, e a reabertura do comércio com restrições voltou a ser permitida. Certamente a dona da padaria deve ter respirado com alta concentração de alívio.

Ação impopular

Nem entro no mérito da decisão do magistrado de Porto Alegre que acolheu liminar de ação popular movida por sindicatos e pela CUT, mas imagino que eles estejam em campanha para reduzir o número de sindicalizados.

Rachadura na estátua

Com todo o respeito, nos últimos tempos a estátua que representa a justiça, a deusa Palas Athena com a balança em uma mão e espada na outra, vem rachando a olhos vistos. Com o valioso auxílio do Supremo, mas não só ele. Em episódios dramáticos como este, os atingidos culpavam o prefeito, o governador ou o presidente, não necessariamente nesta ordem. Hoje, e não é de hoje, repito, o mais simples cidadão profere impropérios contra o Poder Judiciário como um todo.

Vai longe o tempo em que este Poder era unanimidade em respeito e eficiência. Desde a Lava Jato e as sessões abertas e lavação de roupa suja ao vivo e a cores do STF, a base da estátua de Minerva começou a ser solapada primeiro pelas águas da incredulidade, depois pela correnteza da revolta.

Não me alinho com os detratores do Judiciário, mas sinceramente não consigo entender como a magistratura não se dá conta da erosão alarmante do seu prestígio, piorado pela divulgação de ganhos extras enquanto a população come  o pão que o diabo amassou. Faço uma força danada, mas não entendo.

Para deixar bem claro: expor a vida privada do juiz em questão e ofendê-lo, de uma forma ou outra, é atitude condenável.

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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