A melancia humana

19 dez • A Vida como ela foiNenhum comentário em A melancia humana

A severidade como eram tratadas as crianças em décadas passadas, principalmente nas regiões de colonização alemã, italiana e polinésia, para ficar só nestas correntes migratórias, contrasta violentamente com o tratamento que todas recebem hoje nas cidades. Era comum o uso do verbo ralhar, que hoje poucos sabem o que significa.

Você recebia uma descompostura na escola e outra dos pais quando eles sabiam do acontecido. O professor sempre tinha razão.

As proibições alimentares também eram levadas ao pé da letra. Ai de quem deixasse comida no prato, por exemplo.

Outras vinham de superstições antigas, como a advertência de que comer melancia e uva depois “empedrava” o estômago. Beber leite e depois comer pêssegos era outra ameaça de morte triste e dolorida.

Jamais se deveria tomar banho antes de pelo menos duas horas depois das refeições, “congestã” certa. Mistura de frutas com leite vinha do tempo da escravatura. Crendice criada pelos  donos dos escravos para evitar que invadissem pomares e tirassem leite das vacas durante a madrugada.

Todos que viveram aqueles tempos tem algum tipo de má lembrança. A minha veio da mistura de uva ou suco de uva com melancia, a qual se era obrigado a comer até rente da casca, que depois era fervida com açúcar para virar doce, assim como doce de chuchu om melado. 

Mesma mistura para fazer conserva de laranja. As cascas secas serviam para acender fogo no fogão a lenha. Dos ovos se fazia gemada, que, hoje, muita criança nem sabe o que seja.

A galinha era cara, só depois de idosa dela se fazia galinhada. Dizia-se que pobre quando comia galinha um dos dois estava doente, alusão à canja de hospital.

Meus ataques de pânico preferidos foram dois. O primeiro quando comi pimenta achando que era pitanga. Sacanagem de um primo.

O outro foi quando entendi de comer melancia com as sementes para evitar a obra de tirá-las. Esse foi pior. Finda a sessão de melancia, meu irmão fez um ar de pena e dor. Eu tinha cinco anos.

– Infelizmente vai crescer pé de melancia na tua barriga. Das grandes.

E eu acreditei.

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Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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