O fator humano

23 maio • A Vida como ela foiNenhum comentário em O fator humano

 Já fui bancário, vocês sabem. Assim que completei 18 anos, precisava de uma graninha e banco era o lugar ideal para se trabalhar. O expediente era só de tarde, e o salário era bom porque ganhava-se, além do 13º, pelo menos mais dois salários de gratificação. Cheguei a receber cinco em um dezembro em que o banco teve lucro muito grande.

 Quando fui promovido a escriturário, bem no início dos anos 1960, me botaram no setor de contas-correntes. Atendia o balcão. Na época, cada cliente tinha uma grande ficha de cartolina, e os depósitos e retiradas eram feitas com lápis; já o cara atrás de mim tinha as mesmas fichas, mas o movimento era registrado numa máquina de escrever de dois rolos, sendo que tudo era impresso com um solvente especial para um livro. No fim do dia os registros dele tinham que bater com o meu e com uma rubrica chamada de Razão, controlada pelo caixa e checada pelo subgerente, o contador, mais adiante pelo balancete e, depois, no balanço auditado pela matriz em Porto Alegre.

 Qualquer funcionário da agência, mas qualquer um mesmo, podia acessar as fichas sob meu controle, então podia ver saldo, movimento mensal, saldo médio, essas coisas. Mesma coisa com o cara atrás de mim. Não passava pela cabeça de ninguém xeretear a vida financeira dos ricos da cidade, Montenegro. Não era concebível que uma pessoa séria fizesse isso, era pecado mortal, muito menos para vender essa informação cadastral como começou a acontecer depois, meados dos anos 1980.

 O que quero dizer é que não é a facilidade de obter dados sigilosos que mudou as pessoas, as pessoas é que mudaram. Para pior, como podemos ver sem mesmo abrir um jornal ou ver noticiário de TV.

 Está no ar como a maresia.

Imagem: Freepik

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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