Na saída do cinema

19 mar • ArtigosNenhum comentário em Na saída do cinema

Luiz Carlos Félix – luizcflix@outlook.com

Recordar o que testemunhamos, nem sempre deve ser sentido como um ato nostálgico, ou volta ao passado. O tempo passa, tudo muda numa velocidade quase luz, mas muitas coisas ficam na memória.

Na década de 50/60, era comum os jovens de diferentes localidades se reunirem na Rua da Praia, formando ilhas. O Nosso grupo era formado por gente de Encruzilhada, Rio Pardo e arredores. Aos sábados à noite todos, “na beca”, depois de muito papo, escolhíamos os programas e muito se separavam. Cinema, só as salas do centro, reunião dançante ou iam para o Clube Dinamite.  –  Teatro de Bolso, sempre era uma boa pedida, palco para teatro de Revista com peças cômicas, mulheres seminuas e insinuantes, com muito rebolado.  Vimos ali Colé e Silva Filho com as “Certinhas do Lalau” (de Sérgio Porto – Stanislaw Ponte Preta). Depois passou a ser o Cine Palermo. Todos esperavam as vedetes saírem, que iam para o a Boate Marabá ou jantarem no Treviso, que nunca fechava.

Davam-se outros bordejos, como na Confeitaria Matheus na Praça da Alfandega, aberta 24 horas. Lá um atencioso rapaz, sempre nos atendia com direito à provar os biscoitinhos expostos e de fabricação própria, mas o pedido era um farroupilha com pernil de porco, o único que podíamos pagar.

Na Praça da Alfandega, tinha uma figura solitária e esquisita, vestindo casaco de pele. Chamavam de Mariposa. Diziam ser húngara, de amargas feições e   aspecto morfético, que não recebia nenhum assedio.

A Livraria Coletânea nem lembro se fechava, mas era lugar acolhedor, para se buscar cultura, no fim da noite.

Certa noite já em direção ao bonde fantasma, um solitário músico tocava violino na vitrine da Casa das Sedas, era um habilidoso artista da noite. Quando um gajo, gritou – Bravo Paganini e em troca recebeu o estojo do violino na cabeça.

Com a edição dominical do Correio do Povo, embaixo do braço, pesando quase um quilo a noite terminava, sempre tranquila e segura, sem a presença de qualquer brigadiano.

Desapareceu a Rua da Praia e com ela desapareceu o centro lindo, social e seguro.

Chegou a moda do calçadão e fecharam o pano. O teatro acabou.

Ali, passava a vida da cidade, contada e assistida em cima de cada paralelepípedo disputado, por muitos pés.

Página virada, o mundo é outro.

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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