Meu passado de segurança

6 fev • A Vida como ela foiNenhum comentário em Meu passado de segurança

 Quando ouvirem a expressão “no tempo em que se amarrava cachorro com linguiça”, acreditem. É usada para mostrar como, em décadas anteriores, a avida era mais simples e a criminalidade baixíssima. Pois durante uma tarde eu fui transportador de valores – e armado – e carreguei em uma pasta comum o que hoje seria R$ 1 milhão ou até mais. Deu-se em meados dos anos 1960, quando era funcionário comum do Banco da Província, hoje Santander, rua Uruguai com 7 de Setembro, recém chegado do interior.

 No terceiro andar, eu trabalhava na seção “arrancada”, assim chamada porque nós tirávamos os grampos das duplicatas. Em um espaço, ficavam os chamados procuradores, funcionários mais graduados que, como o nome indica, podiam representar o banco em operações em cartórios, levar documentos e contratos sigilosos para empresas e até levar dinheiro para as agências do Interior que estavam com o caixa baixo. Em viagens longas iam de carro, nas mais curtas, de ônibus mesmo. E sempre em duplas.

 Certo dia, na primeira hora da tarde, fui chamado para a sala do chefe dos caras. Deu-se que um deles tinha que levar com urgência uma quantia grandinha de dinheiro para a filial Osório. Como não havia outro procurador disponível perguntaram se eu não topava essa. Claro que sim, só arejar a cabeça naquela monotonia já valia a pena. E ganharia dinheiro para a refeição e uma diária. Dava para comer um bife de verdade com DOIS ovos na pensão da dona Eda, na rua Riachuelo.

 Deram-me um .38 carregado, um porte de arma (ao portador, imagina) que coloquei no cós das calças; cada um de nós – o nome do outro era Homero – carregou uma pasta inchada de cédulas de cruzeiro, moeda da época. Fomos sem nenhum problema e de ônibus PINGA-PINGA, imagina, porque não havia direto. Fiquei pensando o que aconteceria se alguém soubesse que carregávamos aquela dinheirama toda. Provavelmente, nada.  Sim, se amarrava cachorro com linguiça. E agora posso acrescentar uma nova profissão por poucas horas que fosse das tantas que já tive.

 Sim senhores, naquele tempo se amarrava cachorro com linguiça.

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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