A voz da infância
A Câmara dos Deputados aprovou, em caráter definitivo, a flexibilização da Voz do Brasil, terminando com o horário sagrado das 19h às 20h. Hoje ele é uma chatice, prestando-se mais para arroubos oratórios de suas excelências. Até os anos em que a merdolência se apropriou progressivamente do mundo, início dos anos 1970, e antes da internet e redes sociais e até do fax, a Voz do Brasil era um programa informativo de verdade. Digamos que um release das atividades dos três poderes.
Quando era pequeno, em São Vendelino, final dos anos 1940, tínhamos em casa um rádio da marca Mende, que era muito bom nas ondas curtas, que hoje ninguém sabe o que é. No inverno, ele ficava na cozinha para aproveitar o calor do forno a lenha. Eu e meu irmão Paulo Cristiano chegávamos o mais perto possível do aparelho para ouvir as Aventuras do Capitão Atlas, na Rádio Tupy, do Rio de Janeiro. Quando ele terminava, entrava a Voz do Brasil.
A sintonia escapava amiúde e, quase sempre, no momento crítico do seriado do Capitão Atlas. Murphy morava em São Vendelino na época. Daria tudo para voltar aos meus oito anos e sentar, com meu irmão Paulo, com a orelha grudada no rádio Mende para ouvir a Voz do Brasil que fosse. Ouvir o início da Voz do Brasil, com a abertura da ópera O Guarani, de Carlos Gomes, tendo às costas o calorzinho do fogão e, ao lado dele, minha mãe fazendo as cucas e doces que ninguém mais no mundo sabia fazer.