O Rei morreu, viva o Rei

2 jan • NotasNenhum comentário em O Rei morreu, viva o Rei

Ao tirar o manto da hipocrisia, essa roupa tão presente no dia a dia de todos nós, a morte de uma grande pessoa é a festa da mídia. O luto é aparente. Cada um que fala ou afunda os dedos no teclado precisa mostrar algo diferente em relação ao finado.

O caso de Pelé é um destes grandes que exigem textos pretensamente criativos – exceções à parte – sobre um mesmo assunto.

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O disco de Newton

Aprendi no ensino médio uma demonstração prática de como todas as cores se derivam do branco. O gênio Newton bolou um disco com fatias – como se fossem de pizza – com as cores que conhecemos.

Ao girar esse disco em alta velocidade eis o milagre, o disco fica branco. É o que acontece com as centenas de milhares de textos aparentemente diferentes, mas são os mesmos.

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A Maria que ninguém quer

O que é ruim é o fato de muitos escribas terem a retenção de criar algo inédito ao falar do defunto. Então, podem navegar na maionese e, não raro, são gongóricos. Enfim, todo mundo precisa ao menos tentar e não ser mais uma Maria que vai com as outras.

Não há como escapar. Gênio é o resumo bem resumido do que foi Pelé na arte de levar a bola ao seu fim precípuo: o gol. E fim de papo.

Aqueles que amam o prejuízo

Quase todo mundo conhece alguém que já foi vítima do golpe do aluguel, em que o falsário fotografa um determinado imóvel e o oferece aos incautos exigindo um sinal. Depois, toma doril.

Fico com pena ao ver gente que sonhava em um belo veraneio e acabou sem nada. Mas também tenho que admitir que pagar por algo que nem se viu ao vivo é o cúmulo da ingenuidade.

O Brasil tem muito vigarista porque tem muito otário.

Uma morte antecipada

A maioria das matérias sobre Pelé já estava redigida dias antes do desenlace. Quando muito, uma frase que outra sobre os detalhes finais entrou na última hora. Lembra a morte de Tancredo Neves, em 1985, antes mesmo de assumir.

Eu fazia o Informe Especial da Zero Hora nos anos 1980, e já se sabia que a morte dele era questão de tempo. Então se preparou um caderno especial cujo arremate seriam os últimos momentos. Até mesmo entrevistas com pessoas públicas já estavam prontas, mesmo com o estranhamento dos entrevistados.

Um deles foi o arcebispo Dom Cláudio Colling. Ao saber do repórter o motivo, ficou sem jeito.     

– Meu filho, mas ele ainda não morreu.

No fim, ele se resignou com a morte antecipada.

No domingo daquele dia fatídico, eu era o editor de plantão para dar o sinal verde para rodar o caderno especial. Dias antes pedi para o editorialista Pilla Vares que deixasse pronto o texto.     

– Só falta tu abrir o editorial com “Quis o destino…”     

– Não me amola, Fernando, deixa comigo.  

Não deu outra. O deadline estava próximo e o Pilla datilografando o editorial. Na abertura se lia “Quis o destino…”

Prece de ano novo

– Deus, o que são 100 anos para o senhor?   

– Um segundo.   

– E 100 milhões de reais?   

– Um centavo.   

– Então me dê um centavo, pode ser?   

–  Espera um segundo.

Moral da história:  nunca tente passar a perna em malandro longevo.

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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