Nos tempos da Sete
O jornal Zero Hora completou 60 anos na semana passada. Não entendi o número redondo.
Eu comecei minha carreira nela há 54 anos, quando a redação ainda ficava a rua Sete de Setembro, nos altos de um prédio onde hoje é o Estacionamento Rex, alusão ao luxuoso Cinema Rex. As oficinas ficavam na rua Luiz Afonso, Cidade Baixa.
Levar matérias e trazer provas de página entre os dois pontos noite e dia exigia várias caminhonetas, as Rural Willys fechadas para uso da reportagem e picapes para carregar jornais até os pontos de venda e Rodoviária. A impressão era a quente, com linotipos, enormes máquinas de escrever que funcionavam com chumbo derretido.
O dono era o grande jornalista carioca Ary de Carvalho. Ele “comprou” o espólio da Última Hora fechada pelo regime militar em 64. Por ele reaberto já com o nome atual.
Maurício Sobrinho, um notável dono de jornal a quem devo muito carinho – das quatro vezes em que trabalhei no jornal e TV fui levado pessoalmente por ele. Incluindo os anos 1980, quando fiz o Informe Especial.
Pois ele comprou a ZH em dezembro de 1969 e dela tomou posse em março de 1970. Eu sei, porque estava lá.
Quando falei que o Ary de Carvalho “comprou” é porque o prédio é até as máquinas de escrever eram alugadas do Jornal do Dia, um diário de orientação católica. Ary penou porque não tinha capital de giro.
E nós sofríamos porque ninguém gostava do jornal, nem os militares, agências de propaganda, leitores classes A e B, nem as polícias.” Torce e sai sangue”, diziam.
Mas foi ganhando terreno. Quem mudou a imagem do jornal foi o executivo Marcos Dvoskin, nos anos 1970. Foi ele O Cara, claro que com apoio de Maurício e Jayme Sirotsky. A maré começava a mudar.
Era época do domínio absoluto da antiga Caldas Júnior, com o Correio do Povo em formato grande, standard, os tabloides Folha da Tarde e Folha Esportiva. Mais tarde, a Folha da Manhã. A Caldas Júnior e seus jornalistas esnobavam a Zero Hora. Até nos ridicularizavam. Bem, o troco veio depois, como é sabido.
O mundo é redondo e gira. Vale até hoje.