Na beira do inferno

21 dez • A Vida como ela foiNenhum comentário em Na beira do inferno

Relato de uma vítima de trânsito:

“Hoje é  meu quarto dia de repouso. Até agora, tudo tranquilo. Depois que o carro me atirou para o outro lado da rua, vejo que tive muita sorte. Foi assim: o sinal abriu para carros. Tudo bem. Porém, eu estava com a minha muleta canadense, quase no final da travessia e na faixa de segurança. Tem uma placa lá na sinaleira que diz: “Ao dobrar, respeite o pedestre”.

O pedestre, no caso,  era eu… Estatelada no chão, em pânico porque sou biônica, cheia de parafusos e com o quadril esperando resultado de vários exames para ver o que pode ser feito, fiquei em choque. Por isto, o pânico.

Do nível do chão eu, em segundos, vi tanques de guerra se aproximando de mim. Gente, a visão do tráfego, por parte de quem está de pé é diferente de quem está deitada no asfalto. É  assustadora!

Só via pneus vindo em minha direção. Pneus rodando no asfalto preto. Buzinas histéricas de gente que nem sequer sabe o que está acontecendo comigo e xinga os outros motoristas que param. Motos que aceleram arrancadas mesmo paradas, aterradoras. O caos em segundos.

E sou eu quem está lá, sem se mexer, com medo de ter que ir para cadeira de rodas se meu quadril detonar mais ainda. E eu imaginando mais dores! Já tenho dores físicas acumuladas por três o quatro encarnações. Por isto não sou espirita: me disseram que eu, neste corpo atual, acumulo dores de outra vidas. Pode??

Que pânico! Via os sapatos caminhando, na minha direção, trazendo pessoas que se aproximavam de mim. As vozes chegavam baixinhas, porque as bocas ficavam lá em cima.

Eu em pânico, não me mexendo. Estava em posição de crucificada no asfalto. Não posso me mexer, pensava obstinada. Respondo algumas perguntas de um transeunte médico que chegou ali, e me faz exames rápidos, me tranquilizando.

Mas continuava enxergando tudo de baixo pra cima. Um novo mundo se me apresentava. Uma nova visão nunca experimentada, a não ser na areia da praia, tomando banho de sol. Mas lá é bom! Estar deitada no  asfalto foi a coisa mais assustadora que já passei. Nunca tente experimentar. É  como se tanques de guerra avançassem para lhe destruir. Terrível .”
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Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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