Do YouTube ao carrinho de supermercado
O ano é 2015. Sento na cadeira do engraxate. Ele coloca aqueles protetores laterais entre as meias e o calçado, abre sua gaveta de graxas e tintas e começa a trabalhar.
Encostada numa parede, uma mulher que estava a conversar com ele quando eu interrompi o papo ao sentar na cadeira. Depois da escovada para tirar a poeira superficial, retoma a prosa.
– Eu não entendi essa compra. Como tem gente burra nesse mundo. Tu não concorda?
A mulher concorda.
– Pois eu falei pra ela, como tu me compra um celu de 160 real, que tem menos recurso que o de cem?
Ele começa a passar a pasta. Fiquei imaginando quem seria a burra. Filha, irmã, tia, ou a vizinha? Vejo que está fumando, joga fora a bituca e se volta para o amigo.
– E não se toca mesmo. Já quebrou até o tabel e agora quer outro. Não vou dar! Nem tenho recurso pra essa gastança.
A filha, então. Só pode.
O engraxate faz tsk tsk tsk com a língua encostada entre o céu da boca e os dentes, depois fala.
– De cravar essa. Celular que nem aitubo tem…
Credo digo eu. Sapatos reluzentes vou para a roda do cafezinho.
Encontro o fotógrafo Ricardo Stricher que me conta uma boa que viu e ouviu no Brique da Redenção. Dois vendedores discutem, e um deles trucida o outro.
– Tu é muito do chinelão, cara! Tu não tem nem carrinho de supermercado!
Como eu sempre digo para a gurizada, vivendo e aprendendo.