A década da falsificação
Bebia-se muito uísque nos anos 1970, no lar, no bar e no mar. Espumantes então chamados indevidamente de champanhe, só em bailes, ocasiões festivas. Havia poucas marcas disponíveis fora as importadas, como a preferida Veuve Cliquot, devidamente rebatizada da a viúva. Mas essa só para quem tinha muita bala na agulha. Vinhos da moda eram os alemães, do Reno e Mosela, garrafas marrons e verde claro.
A marca preferida era a Liebfraumilch, que nem marca registrada era, um vinho comum de mesa relevado à condição de divindade. Vinhos melhores eram os da categoria “mit Predikat”. Depois veio um vinho “alemão” da Argélia, garrafa azul, o preferido dos otários. Os chilenos recém começaram a aparecer, muito bons. Vinhos nacionais bons, poucas marcas. Alguns metidos a besta davam azia até em bicarbonato.
Então voltamos ao uísque. Bebia-se muito mais que hoje, pois havia hábito de beber ao meio-dia. Nos bares, chope, cerveja e uísque, muito. As marcas nacionais mais conhecidas era o Old Eight, Scot’s bar (derretia laringes e faringes), Drury”s e Natu Nobilis. O pioneiro foi o Mansion House (!), nos nos 1960, logo chamado de Mãos ao Alto. Também eram produzidos “uísques” de gengibre e falsas ervas, eficazes derretedores de fígado.
Até os destilados nacionais podiam ser falsificados. Se fosse em boates e cabarés do terceiro time, 100%. A garrafa era autêntica, tiravam o fundo ou injetavam a falsidade com seringa de injeção na cápsula. Mas era trabalhoso. Estrangeiro, caríssimo na época, já valia a pena. Por cima, em torno de 80% era frio, dependendo do lugar onde se bebia.
Em certos bares era costume comprar a garrafa e deixá-la lá. Uma fita com o número de doses colada nela. Ao sair, o dono fazia uma marca com caneta para medir o bebido. Em locais mais pecaminosos, o garçom tinha que abrir em frente ao comprador. Facilitava e ele despejava a bebida no balde com gelo.
Nunca se bebeu tanto uísque frio como nos anos 70.
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