Sacanagem muda
Montenegro, cidade em que morei da adolescência até meus 20 e poucos anos, tinha dois cinemas: o Goio-en (palavra indígena) e depois o Tanópolis, devido à riqueza da cidade, a produção de tanino a partir da casca da acácia-negra. Foi no Goio-en que vi meu primeiro desenho animado nos matinais de domingo de manhã, 1950, e depois no matiné, às 14h. Havia ainda a sessão vesperal, geralmente às 16h; à noite, a primeira e a segunda sessão. Tinha também a sessão da meia-noite, que conto abaixo. Era barra pesada.
O Tanópolis surgiu pouco antes de fechar o Goio-en. Era maior, poltronas estofadas e não de “pau duro”, a piada pronta da época. A tela era grande para suportar filmes em cinemascope, a novidade mundial que surgia. O dono era o mesmo, Carlos Gustavo Jahn Filho. Ficamos deslumbrados com o 10 Mandamentos, com três horas de duração, que exigia um intervalo para rebobinar o filme e colocar a parte final.
No Goio-em exibia-se de vez em quando filmetes com colagens de curtas mudas de sexo explícito do tempo do cinema mudo. Não havia propaganda nem cartazes, o dia era sussurrado de boca a boca, Deus m’o livre se as pudicas senhoras e esposas soubessem. Desconfio que sabiam, não há segredo em cidade pequena. E nós, “de menor”, ficávamos desolados sem a mínima chance de ver os “filmes de sacanagem”.
No dia em que completei 18 anos, casualmente houve uma sessão da meia-noite no Goio-en. Foi com que orgulho que esfreguei minha identidade na cara do porteiro, de sobrenome Panitz, que me deixou entrar meio a contragosto. Peguei no sono madrugada alta. Só adormeci depois de um certo esforço físico autoinfligido.
Imagem: Freepik
O Fernando Albrecht tem refrescado a minha memória de uma movimentada infância e juventude ,em que convivíamos mais de perto,inclusive pilotando os “teco-teco” do Aeroclube de Montenegro. No cinema Goio-En, era um “sarro” quando o Panitz (bilheteiro),antes de começarem as filmagens, percoorria os corredores ,a “100 por hora”,com os pés bem abertos (10 prás 2) igual ao que fazia o Charlie Chaplin,e com uma baita baita vara “cutucava” os ventiladores de parede para começarem a funcionar. Após escurecer o salão de cinema ,era a vez do Ari Viegas percorrer os corredores ,”decorado” com suas lâmpadas pisca-pisca.