Minha estada no inferno
Uma das coisas mais desagradáveis que marcaram minha adolescência era a confissão. Minha mãe era uma católica muito fervorosa. Não permitia que se passasse uma semana sem ajoelhar naquela madeira dura do confessionário e falar, pela abertura quadriculada, para o padre, de ouvidos atentos do outro lado.
– Mas eu não pequei, mãe!
– Pecou sim, ou tu pensa que não te conheço? – dizia ela, desdenhando meu pânico.
Maldição! Epa, outro pecado, se bem que praguejar é pecado venial. Os pecados se dividem em veniais e mortais. Os primeiros você não necessariamente precisava mencionar ao confessor, mas os segundos eram obrigatórios. Sem purgar a mora, digamos assim, ia-se para o inferno. E ia duas vezes se comungasse. Era meu caso, porque em boa parte das vezes eu só confessava os veniais.
– Só isso? – perquiria o sacerdote. – Tem certeza de que não pecaste nem uma vez? Não tocaste teu corpo?
Tocar o corpo significava masturbação. Ao negar a aproximação corporal, eu ruborizava tanto que a igreja toda deveria estar iluminada de vermelho.
– Bem…quer dizer…tocar, toquei, mas não fui até o fim – respondia triunfante. Uma solene mentira, de fato, então era mais um inferno à vista com o diabo me espetando com um tridente em brasa.
Então vinha o sermão, que um bom católico não se aproximava do seu corpo e a castidade era necessária blá blá blá. E ato cointínuo, a penitência. Não contei, mas devo ter rezado pelo menos 100 mil Padre Nosso e Ave Marias, sem citar o terço. E, por fim, o cara ainda me perguntava se eu me arrependia de verdade por ter cometido o pecado da carne.
– Claro! – dizia, sacudindo energicamente a cabeça para confirmar a mentira.
Evidentemente que esse arrependimento durava apenas um dia, se tanto. Pelo menos por 24 horas eu me sentia o mais piedoso dos cristãos e com entrada garantida no céu, com anjinhos cantando e sei eu que mais festividades inocentes eram feitas.
Cá entre nós, tocar o corpo era muito mais divertido.