• Mãos nos bolsos

    Publicado por: • 27 mar • Publicado em: A Vida como ela foi

    Uma das pegadinhas mais  notáveis que se fazia, nos verdes anos, era pegar um garoto simplório e perguntar quantas bolas ele tinha. Não se falava testículos. Primeiro, ele ficava desconfiado, mas, assim que se viravam as costas, vinha pergunta.

    – Tenho duas, por quê?

    Tem que entender que, naqueles tempos, a gurizada ainda brincava de mocinho aos 15 anos. Fazíamos um ar de pena, sacudindo a cabeça.

    – Mas bá, todo mundo tem três! É defeito de nascença, que azar o teu.

    Pelo menos um terço ficava desconfiado ou entrava em pânico depois de botar as mãos nos bolsos da calça para examinar os países baixos. Meu primo José Omar me aplicou essa quando eu tinha 8 ou 9 anos. Por sorte, avistei um touro no potreiro do meu tio e dei uma de voyeur.

    Se o touro tinha só duas, porque os meninos deveriam ter três? Mas que botei as mãos nos bolsos, botei.

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  • Baixíssima capacidade de atração e baixíssimo conhecimento – os males do brasileiro são.

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  • Diário da peste

    Publicado por: • 27 mar • Publicado em: Caso do Dia, Notas

    QUANDO Martha Suplicy tinha um programa de televisão, lascou uma frase memorável: relaxe e goze. O contexto era outro, mas é uma frase muito especial para os dias que vivemos. Nada de cobrir a cabeça com cinzas e se flagelar com um cinto cheio de tachinhas. Não teremos o Armagedon por causa desse bichinho malvado, então cometa os pecados que quiser. Pelo menos pecados da cama.

    O RISO também não é proibido. Mesmo isolado em casa e tendo que encarar a perpétua 24 horas por dia, não fique de cara amarrada. Até porque ela tem que aguentar a sua também 24 horas por dia.

    OLHE o lado positivo da bronca. Você não precisa aguentar a cara do chefe e nem ouvir as piadas centenárias do colega chato, piadinhas sem graça já contadas pelo Noé quando a água baixou.

    VEJA meu caso. Nunca consegui tirar férias, exceto quando fiz cirurgia para tirar um tumor do reto. Para atualizar minha ficha corrida, os checkups estão me dando o prazer de saber que estou zero bala, para desgosto dos meus inimigos. Tirei o reto da reta, por assim.

    AGORA estou em férias da redação. Escrevo de casa pelo celular, porque o tablet foi invadido pelo coronavírus. Os sintomas são o corretor do Android se meter de pato a ganso e as teclas ficam sonolentas. Chamam isso delay. Escrevo delay e olha o que saiu: departamento.

    COM o isolamento meu saldo bancário melhorou muito. Não almoço mais na rua, nem gasto com lanches e contas de ocasião. E a comida de casa é bem mais barata. Eu sou um consumista, sabe?

    ENTÃO tenho mais alegrias que tristezas com o dragãozinho chinês, desde que ele não me leia e diga “Ah é, é?”

    HÁ outras vantagens advindas do bichinho.  O pagamento dos impostos federais deve ser prorrogado – eu sou PJ – e com isso ganho um bocado se tempo. E tudo isso graças a você, meu pet invisível. Só não te boto na coleira para passear porque o governo não deixa. E se eu conseguisse botar a coleira…

    PARA quem me rogou uma praga, posso dizer que fiz um acordo com ele: eu pego leve e você não pega pesado comigo. Aliás, já pegou. Há três semanas você me presenteou com vírus e, tossezinha de nada e alguns espirros, quadro que durou uma semana. Só pode ter sido você, ou tem um coronavírus do B na praça?

    COM os novos tempos, veremos mudanças estéticas notáveis nos homens. Parte que tinha barba vai raspá-la para não servir de alojamento de vírus.E, sem barbearia, haverá uma explosão de cabeludos.

    600x90 SABEMOS que é muito difícil criar e eliminar matéria. Não vale totalmente para o jornalismo. Criam tantas matérias abomináveis que é difícil destruí-las.

    COMO diz o médico e pecuarista Jorge Crispim, para acertar no carrapato estão matando a vaca.

    PELA primeira vez em cinco dias, como um sanduba de manteiga, geleia e café com leite. Meu sonho de consumo é uma à la minuta  com bife de filé e 2 ovos, com as bordas crepitadas. Um carreteiro de filé com feijão mexido e cebola picada seria uma boa ideia.

    ALIÁS, na H1N1, inventaram o Tamiflu. Está na hora de aparecer o Tamiflu do coronavírus.

    PENSAMENTO DO DIAS

    Em tempos de isolamento, felizes são os solteiros.

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  • Todo mndo rico

    Publicado por: • 27 mar • Publicado em: Artigos

    Davi Castiel Menda

     Já imaginaram: todos os 210 milhões de brasileiros, cada um com um milhão de dólares na mão?

    Nesta situação que estamos atravessando, em que todos são PHD’s em qualquer assunto, em que os governos liberam generosa e escandalosamente suas burras para amenizar a situação do povo, apresentadores de TV nos transmitem ideias esdrúxulas as quais nos sentimos constrangidos com tanta ignorância ou insensatez, ficamos a imaginar se já vimos de tudo.

    Não, não vimos. Profetizando nossos temores, algo de fantástico aconteceu. Os países mais ricos do mundo se cotizaram, passaram um whats para alguns políticos brasileiros, estes se reuniram às pressas em Brasília, a Câmara aprovou à tarde. o Senado ratificou à noite. Venderam a Amazônia! Valor: 210 trilhões de dólares.

    Motivo apresentado para aprovarem a venda: o valor seria distribuído entre todos os brasileiros, em partes iguais. Um milhão de dólares para cada brasileiro, brasileira, independentemente de sua situação financeira, idade, credo ou cor.

    Nem sei se existe esta dinheirama toda mas, vamos dar asas à nossa imaginação e acreditar que sim. Já imaginaram, todos os 210 milhões de brasileiros, cada um com um milhão de dólares na mão? Todo mundo rico!

    E, eu pergunto, e daí?

    Inicialmente, haveria uma corrida aos bancos, num processo inédito e inverso ao tradicional, todos desejando depositar seu milhão (de dólares) na poupança. Como? Quem falou? Os bancos não pagariam juros? É óbvio, não tendo para quem emprestar, na realidade os bancos cobrariam taxas – elevadíssimas – para guardar seu dinheiro. Esqueça a utópica possibilidade de viver de rendas.

    Randomicamente, escolhamos uma categoria profissional: pronto, a dos executivos, acostumados a mordomias, secretárias elegantes, bonitas, motoristas atenciosos – a partir de agora não poderiam mais contar com esses, por um simples motivo: por que alguém, com um milhão no bolso, iria trabalhar por quaisquer dois, três ou cinco mil reais? E dando um salto na escala empregatícia, e com o devido respeito à profissão, que nada deve a dos executivos, quem iria recolher o lixo?

    E aqueles que sempre sonharam com a casa própria, teriam a maior decepção de sua vida. No contraponto da escassez histórica de moradias versus excesso de dinheiro e compradores, um simples apartamento JK valeria algumas dezenas de milhões de dólares, frustrando os novos-ricos que, apesar de endinheirados, continuariam catalogados na categoria dos sem-teto. Novos imóveis não seriam construídos, pois os trabalhadores da construção civil, carpinteiros, mestres, ou simples peões, agora travestidos de milionários, estariam indisponíveis pensando nos seus investimentos.

    Os colégios fechariam, afinal, 100% dos estudantes, ricos já na adolescência, não teriam mais desafios pela frente. Milionários, sabendo digitar alguns sons onomatopéicos no teclado do seu computador, o suficiente para entrar no facebook ou twitter da vida, e manter um resquício de tentativa de comunicação com o mundo exterior, estariam plenamente satisfeitos e realizados.

    Meus amigos, proprietários de agências lotéricas, quebrariam de vez. O sonho de milhões de brasileiros, de enriquecer através do acerto de qualquer uma das lotéricas numéricas, se tornaria inócuo. A venda da Amazônia se encarregaria de liquidar com a mania nacional das filas em busca do acerto da mega sena acumulada. Seria o fim das lotéricas.

    E, entre tantos dissabores, duas alegrias!  A primeira, não haveria mais o Big Brother Brasil! Os prováveis participantes, donos de um milhão cada um, não se interessariam pelo valor modesto do prêmio, e nós finalmente estaríamos livres dessa praga que assola a televisão brasileira com diuturnidade. E a segunda: o INSS estaria livre da falência tão sistematicamente apregoada: os aposentados, velhinhos e velhinhas, agora todos milionários, deixariam compulsoriamente de receber suas pensões e aposentadorias, que tanto prejudicam o Instituto, permitindo desta forma que o governo aumentasse os salários dos sofridos deputados e senadores, para um valor mais do que justo, estimado em 91%, e não o “salário de fome” que hoje percebem.

    Ninguém mais seria empregado – todo mundo financista, banqueiro, patrão, prestamista (um eufemismo para o agressivo vocábulo agiota), mas todos sem clientes, sem empregados, sem tomadores para o dinheiro fácil. A inflação que grassou na Alemanha no século passado, quando as pessoas eram vistas carregando um carrinho de mão atulhado de dinheiro, com o intuito de comprar apenas um litro de leite, ao custo de bilhões de marcos, seria “fichinha” perto da inflação a que seríamos acometidos.

    Pelo menos estaríamos livres daqueles distribuidores de santinhos que infestam as principais ruas das cidades, oferecendo dinheiro à vontade, afinal de contas, ninguém precisaria mais de empréstimos. Todo mundo rico…

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  • A morte pela cura

    Publicado por: • 26 mar • Publicado em: A Vida como ela foi

    Quando eu era menino, o temor dos médicos se resumia à varíola, essa, sim, uma assassina, sarampo e tuberculose. Havia ainda a escarlatina, doença que deixava você com cor de vestido de cardeal em dia de missa dominical.

    Que eu lembre só essas. Também havia a coqueluche. que causava tosse ininterrupta nas crianças. Como não havia vacina e medicamento específico, o remédio era respeitar. Só que não contavam com a astúcia da FAB.

    O micro-organismo responsável pela tosse era muito sensível à altitude e variação brusca dela. Então nossa querida Força Aérea Brasileira lotava aviões com crianças e subia até 3 mil metros.

    A maioria ficava curada. O problema é que havia muita criança e pouco avião. Perdi minha chance de voar de graça, ainda mais que morava a 100km de Porto Alegre.

    Um detalhe final. Olhem nos braços dos idosos, quase todos têm cicatrizes da vacina. Não se aplicavam injeções. As enfermeiras raspavam a pele com um pequeno frasco aberto numa extremidade. A borda áspera de vidro facilitava a penetração na pele. Coçava pra caramba e infeccionava, às vezes, seriamente. Dá para dizer que quase se morria da cura.

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