Os contadores de votos

10 out • A Vida como ela foiNenhum comentário em Os contadores de votos

No final dos anos 1960, fui convocado para ser contador de votos. Que saco, pensei. E não é que eu estava certo? Vocês não têm ideia de como era feita a apuração, como o processo era cansativo e cheio de furos. Eu recém tinha entrado para a Zero Hora. Então, queria assassinar o cara que deu meu nome. Vilmo Medeiros, meu querido chefe de reportagem policial, foi chamado pelo TRE-RS e levou alguns subordinados para o mesmo inferno. Eu ente eles.

A contagem se dava nos primeiros Armazéns do Cais do Porto, com amplos espaços divididos por placas de compensado. Era eleição para deputado estadual e federal e não lembro para que mais. A mim e meus asseclas coube a contagem para a Assembleia Legislativa. Funcionava assim: a chefia separava as cédulas e as distribuía. Duplas contavam os votos, um cantava e outro fazia aquela marcação antiga de risquinhos até completar cinco. Brancos e nulos já tinham sido separados.

Além da rotina massacrante, tínhamos que aguentar os fiscais de partido, que, às vezes, pediam recontagem das cédulas e eram atendidos ou não pelo juiz. E meus colegas de outros jornais querendo saber detalhes como o texto dos votos anulados com palavrões, coisas assim. Havia uma pausa para o almoço, gente, oferecimento da Justiça Eleitoral.

Foram três dias de martírio, das 8h da manhã até a hora de não aguentar mais. Litros de café me deixaram com tremedeira e insônia. Quando a apuração encerrou, os m’ partires ganhavam um dia de folga, com atestado que valia pontos, caso se fizesse concurso público.

Simplesmente não consegui dormir. Minha futura sogra me deu um comprimido de Valium tamanho família, aquele de quilos e não de miligramas. Nem ele me ajudou a dormir. Eu parecia um zumbi na cama. Fui convocado pela segunda vez alguns anos depois, mas não lembro de muita coisa. Talvez meu cérebro tenha apagado a terrível experiência.

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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