O sequestro do bonde

21 dez • A Vida como ela foiNenhum comentário em O sequestro do bonde

Na Porto Alegre dos anos 1960, ainda com ondas de pachorra conforme os ventos, não faltaram feitos audazes de pândegos cujas proezas poderiam perfeitamente ser história para o cinema. Personagens cuja missão maior nesta vida era produzir o que hoje chamamos de pegadinhas, como o famoso Odone Greco. Uma das histórias quase desconhecidas dele me foi contada pela irmã, Iole Greco Soares.

Odone só começou a trabalhar mais para o fim da sua vida. Uma das coisas que ele conhecia bem era a regulagem de motores, e era muito bom nisso. Dona Iole narrou que ele abriu uma oficina jocosamente batizada de Reguladora Xavier, medicamento usado por mulheres com  problemas de fluxo menstrual. Se Odone ficou conhecido na época, muitos ficaram no anonimato, apesar de feitos memoráveis. Até, porque feitos em conjunto.

Foi o caso do sequestro do bonde. Depois de poucos comes e muitos bebes, um grupo que se abastecia nos bares do Centro Histórico até noite alta resolveu ter um bonde só para ele. Uma das linhas, o bonde Riachuelo, fazia uma parada na frente da padaria Paris, que existe até hoje, a poucos metros da Borges de Medeiros. O motorneiro e o cobrador faziam um lanche e deixaram o “elétrico” estacionado e entregue à mala suerte.

Os pândegos, meia dúzia deles, entraram e foram rumo à louca aventura pelas ruas da cidade. Dirigir bonde não era difícil, alavancas de freio e aceleração, uma roda que travava manualmente as rodas em caso de falta de energia, e deu. Assim foram à toa por vários bairros, movendo os trilhos em bifurcações com uma haste própria para este fim.

Ao se darem conta do acontecido, os desesperados tripulantes ligaram para a Carris. Até acionar socorro policial levou um tempão. Entrementes, os farristas fizeram o tour até que a prudência falou mais alto. Escafederam-se mas esqueceram  um deles, um general da reserva que dormia no banco, que nem mesmo sabia o que se passava.

Quando a cana finalmente encontrou o bonde com o militar subitamente desperto, sem saber o que estava acontecendo, deixaram tudo por isso mesmo. Afinal, eram tempos da Revolução e bulir com um general, mesmo de pijama, não era uma boa ideia.

Imagem: Acervo Roberto Henry Ebelt

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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