O olho da Gioconda

17 jan • A Vida como ela foiNenhum comentário em O olho da Gioconda

Era um estranho bar. Ficava nas imediações da Usina do Gasômetro, Porto Alegre. Um pé-sujo clássico, desses de mesa de fórmica, dono atrás do balcão vestindo um avental que já viu melhores lavanderias. Cachaça, cerveja, vinho barato e, na prateleira, meia dúzia de garrafas de bebidas diversas cobertas de poeira. Mas os fregueses gostavam mesmo de um pôster esmaecido da Mona Lisa, afixado na parede ao lado do tosco banheiro.

O detalhe é que não era uma simples reprodução do quadro de Da Vinci. Um dos olhos da La Gioconda estava tapado, como se tivesse um tapa-olho de pirata. Que gênio, murmurava um assíduo cliente, tido pela roda como um intelectual, e como tal, muito respeitado. Era a rebeldia de quem criou essa imagem singular, repetia, uma releitura do clássico italiano, levantando o copo de cuba libre à guisa de saudação. Respeitosamente, a plebe ignara o imitava.

Um dia, um dos frequentadores estava esperando sua vez de entrar no banheiro, e sem nada a fazer, fixou o olhar no tal pôster. Olho no olho, literalmente. De repente, soltou um berro. Apontou o indicador da mão direita no rosto da enigmática senhora e com o da mão esquerda mirou a roda de amigos. Todos foram ver a razão do espanto.

Não era um tapa-olho clássico. Eram os restos mortais esparramados de uma barata GG que alguém matara com uma chinelada.

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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