O muro do sem-vergonha
Temos o hábito de dizer que, em tempos passados, os usos e costumes eram bem mais saudáveis e a juventude menos rebelde, só que não. Embora não atinja a desobediência civil nas escolas como hoje, gentileza do doutor Paulo Freire, e as drogas eram quase inexistentes, território desconhecido, com exceção da maconha – chamar alguém de maconheiro era como chamá-lo de bagaceira. Não era fashion, como hoje.
Mas bebia-se e fumava-se muito cigarros que dão câncer desde a adolescência. Os trejeitos ao levar o cigarro aos lábios e as acrobacias das espirais de fumaça era de bom tom, puro charme para as garotas. Garrafa de cerveja vazia não se tirava da mesa, dava status beber muitas. Talvez a melhor maneira de ilustrar aqueles tempos, segunda metade dos anos 1950, seja o caro internato do Colégio São Jacó, de Hamburgo Velho, Novo Hamburgo – hoje Feevale -, tocado pelos Irmãos Maristas.
Havia uma separação entre a Divisão dos Menores, abaixo dos 15 anos, e dos Maiores, de 15 para cima. No caso dos maiores, entre eles este colunista, os internos tinham algumas mordomias. Desde que os pais autorizassem, podia-se ir para casa nos finais de semana e voltar até domingo à noite. O cigarro era liberado, com exceção das salas de aula, do dormitório e do refeitório.
Para quem ficava, havia um cinema com filmes policiais ou faroestes, desde que não ofendessem a pudicícia dos religiosos. O almoço dos domingos, chamado de Lavoisier (nada se cria, nada se perde, tudo se transforma) era regado a uma cerveja para cada dois alunos. De tarde ia-se ao Cine Lumière, no centro de Novo Hamburgo, onde se paqueravam as alunas de um colégio de freiras que ficava no lado oposto da rua do São Jacó. Encontros posteriores eram difíceis, mas não impossíveis.
O que este colunista pode atestar é que o muro do colégio das freiras não era tão alto assim.
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