O mocotó da americana
A turista alemã queria conhecer a culinária tipicamente gaúcha em Porto Alegre. Com alguma dificuldade, conseguiu que a amiga que a hospedava a levasse para o Mercado Público. A amiga também não conhecia bem o que vinha a ser culinária tipicamente gaúcha – para ela era churrasco, carreteiro e deu. Percorreram os restaurantes da volta do Mercado até que ela leu um aviso “Temos suculento mocotó”. Todo mocotó é suculento, posto que é quase uma sopa, mas deixa pra lá.
A gringa queria saborear o prato, que de tipicamente gaúcho não tem nada. Mas do que era feito, quais os ingredientes? Um garçom que tirou curso avançado de ze buque iz on ze teible encarou a parada dura. Deixa comigo, garantiu, peito estufado de orgulho.
– Zis is a soupe, bins uaite and trips but trips are very clin, understengue?
Nenhuma das duas captou o inglês do poliglota, tirando “bins” que compreenderam como beans, feijão, e, a duras penas, o very clean, mas ficaram boiando no uaite, no soupe, e não abriram o olho com trips, as tripas na versão volta do mercado. Pela pronúncia, trips remetia a viagem.
Talvez convicta que esse “mocotou” propiciava algum tipo de viagem lisérgica ou efeito semelhante, a americana alimentou alguma fantasia erótica, sabe-se lá. Seja como for, o inglês do garçom que mais parecia cruza de esperando com o dialeto urdú do Iraque a convenceu A brasileira não quis nem saber, fez cara de nojo, mas a turista americana adorou o sabor.
O tal garçom já faleceu há muitos anos, mas contam que morreu feliz por ter falado um inglês impecável, a tal ponto que a turista captou a mensagem.
– Isso que nunca estudei ingleis de verdade, então sou bom pra caramba, podes crer!
Foi outra trip daquelas.