A volta
No tempo em que a bebida da moda era Cuba Libre e o chope era tão barato que – por pobre que você fosse – sempre podia pagar por dois ou três diariamente, havia uma “república” de uruguaianenses na altura no Centro de Porto Alegre. República, para quem não sabe, consistia em um grupo de amigos ou conterrâneos alugar uma casa ou apartamento. As despesas eram rateadas, as tarefas caseiras também.
Pois nesse grupo estava o B., um baixinho afável e tremendamente ingênuo, não contaminado pelos falsos valores da cidade grande e dos seus cruéis nativos. Como costuma acontecer com interioranos não-aculturados, ele vivia sobressaltado, crédulo que era. Tudo doía, tudo machucava mais que cerca de arame farpado que limita os campos da imensidão da Fronteira Oeste, um azarado perdido numa noite suja.
Um dia, os amigos resolveram pregar-lhe uma peça. Gravaram em um gravador desses grandalhões, que era o menor que existia na época, uma fala com jeito de ser uma notícia de última hora da edição noturna do Correspondente Ipiranga, da Rádio Guaíba. Certa noite, quando B. estava entretido lendo sua coleção de Pato Donald sentado no único sofá do apartamento, colocaram o gravador atrás do grande aparelho de rádio, e sem ele ver acionaram a gravação.
– E atenção, muita atenção! Cientistas confirmaram que a Lua vai mesmo se chocar com nosso planeta em poucas semanas!
B. nem levantou a cabeça, não entrou em pânico, não gritou que horror! e nem bradou aos céus e muito menos chorou. Terminou calmamente de folhear a revistinha, fixou o olhar perdido em algum ponto distante que só ele via, e com toda calma e displicência disparou uma única frase desvestida de qualquer emoção.
– Vou voltar para Uruguaiana…