A vingança da guanxuma

18 jul • A Vida como ela foiNenhum comentário em A vingança da guanxuma

Barbeiro, hoje, não gosta de ser chamado de barbeiro. É cabeleireiro. As voltas que o mundo dá. Nos meus tempos de adolescente, se chamasse um barbeiro de cabeleireiro o cara pedia briga ou eu ganhava uma bofetada, o que viesse primeiro.

Os pais eram inflexíveis. Cabelo comprido, só depois dos 18 anos. Cabelos como os dos Beatles, só depois dos 21, e morando longe, emancipado. Tenho lá minhas desconfianças que os velhos não gostavam de fartas melenas porque amorteciam o croque, o peteleco, aquele horror de dar com os nós dos dedos no cocuruto. Vivíamos a Santa Inquisição, então. Um padreco,certa vez, obrigou-me a joelhar em cima do milho por uma hora. Quando falei para meu pai, apanhei de novo,

– Alguma tu fez!

Aprontei mesmo. E fi-lo porque qui-lo. Eu tinha amarrado vários pés de guanxuma entre si no pátio do ginásio e esperei o Irmão Ratinho fazer sua trilha e enganchando o sapato no arco formado por dois pés. Com que alegria selvagem vi o profe se estatelar no chão, levantar sem saber bem o que tinha acontecido e, em seguida, voltar a cair porque pegou outra armadilha de guanxuma. Oh, que glória, louvado sejas Senhor da Vingança!

Voltando às barbearias. Como os barbeiros eram orientados pelos pais a fazer um corte zero, era duro cortar o cabelo com as máquinas manuais de cortar, aqueles em que dois segundos antes de ceifar os fios o cara levantava o instrumento de tortura arrancando os fios pela raiz. E sem anestesia. Tentei várias vezes uma vingança, mas nenhum deles tinha moitas de guanxuma no seu caminho. E a primeira barba com navalha então?

Naqueles tempos, como dizia Jesus na Bíblia, todo barbeiro findava a barba passando um líquido chamado Água Velva, um negócio ardido com um perfuminho atroz. Para que não quisesse, porque paga, restava o álcool puro ou talco. O Carlinhos Ribeiro me contou que o seu barbeiro era anarfa, então errava nos eles e erres. Terminado a barba, cabelo e bigode, ele perguntava apresentava as opções.

– Arco ou tarco?

E o Carlinhos:

– Verva.

Foto: João Bagatini/Flora Digital

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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