A primeira vez

31 jul • Caso do Dia, NotasNenhum comentário em A primeira vez

O primeiro cadáver que vi quando comecei na reportagem policial foi em outubro de 1968, na avenida Protásio Alves, bem em frente ao Barranco. O motorista de um fusca não venceu a curva e bateu em um poste. Quem abraçou a morte foi sua noiva que estava ao lado, ele mal e mal se feriu, assim como a sogra que viajava no banco de trás. Como a noiva usava joias, a Perícia teve que retirá-las, então fui arrolado como testemunha visual para evitar rolos futuros. O primeiro homicídio de trânsito a gente nunca esquece.

A MORTE COMO ROTINA

Depois disso, a rotina da morte me deixou de casca grossa. Até mesmo a visão de uma menina estrangulada que apareceu morta de madrugada em um depósito de colchões na Aparício Borges. Um rapaz quis violentá-la e deu no que deu. Só que ninguém sabia na hora. Falei com ele. Achei um “aí tem” e deixei o relatório para o Chefe de Reportagem, o Vilmo Medeiros. Um dia depois, o rapaz confessou.

A HISTÓRIA COMO ELA NÃO É

Com o jornalismo praticado naqueles anos 1960 comparado com o de hoje minha casca grossa foi amolecendo. Não estamos mais fazendo jornalismo. Estamos contando a história como ela não é. Jornalistas despreparados com vocabulário de menos de cem palavras e leitura zero levaram a essa desolação. Repórter não reporteia mais, emite opinião. E em vez de opinar, é colunista quem agora dá furo.

NOITES SEM BRONCA

A redação da Zero Hora nos anos 1960 ficava na rua Sete de Setembro pouco depois da Caldas Júnior. Hoje é um estacionamento ou um edifício, não sei mais o número. Nas madrugadas quentes e sem bronca, esticávamos a ronda Delegacia-HPS-Plantão do DPJ-Delegacia de novo acrescentando incertas em bares da Zona Sul para tomar algumas cervejas em Ipanema. Desnecessário dizer que naqueles tempos a criminalidade era muito baixa.

A NOITE DOS RATOS

Certa madrugada, dei-me conta que, para ir da Sete de Setembro até o bairro Ipanema, só cruzávamos três sinaleiras. Três. A gente nem parava no vermelho, porque a única coisa caminhante nessa hora era formiga ou rato procurando algo para roer. Não esqueçam que Porto Alegre chegou a marca de 40 mil automóveis só em 1970.

MEU MÍSSIL, MEU AMIGO

Deu no Correio do Povo: agentes de segurança americanos confiscaram nesta segunda-feira em um aeroporto de Washington um lança-mísseis encontrado na bagagem de um cidadão do Texas, que garantiu se tratar de um souvenir do Kuwait. Souvenir, é? Em breve, alguém vai querer emplacar um tanque ou canhão antiaéreo.

RESFRIADO DO B

O que houve com o velho e bom resfriado que não passava de alguns atchins? Hoje, ele te atropela e as dores são iguais a um.

Fernando Albrecht é jornalista e atua como editor da página 3 do Jornal do Comércio. Foi comentarista do Jornal Gente, da Rádio Band, editor da página 3 da Zero Hora, repórter policial, editor de economia, editor de Nacional, pauteiro, produtor do primeiro programa de agropecuária da televisão brasileira, o Campo e Lavoura, e do pioneiro no Sul de programa sobre o mercado acionário, o Pregão, na TV Gaúcha, além de incursões na área executiva e publicitário.

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