A madrugada perfeita
Madrugada, chuva batendo, pingos realçados pelas luminárias na rua, que eu via do segundo andar do apartamento onde eu morava no prédio número 533, da rua Duque de Caxias de meados dos anos 1960. As copas das árvores do lado esquerdo dançavam com o vento, como se quisessem sacudir a água que as molhava. Essa cena está firme na retina dos meus olhos e é uma das memórias mais tranquilizadoras e felizes da minha vida. Naquele apartamento simples, fui muito feliz.
Da basculante da cozinha, eu via uma boa parte do sul do Guaíba e da cidade de Guaíba do outro lado. À frente, eu tinha a vista descrita. O cenário perfeito para um dia de chuva, vento e frio, debaixo de um cobertor de penas de ganso, que minha mãe fez especialmente para mim. Não raro uma companhia feminina furtava calor dele e do meu corpo.
Ganhava pouco como bancário, mesmo graduado. A Faculdade de Jornalismo e depois como repórter da madrugada da Zero Hora, completavam minha vida quase perfeita. No banco da Província, eu recebia 600, não lembro se mil ou milhão de cruzeiros. Uma colega de aula, a Genoveva, certa vez, disse-me que eu repetia que estaria tudo bem até o ano que vem se eu recebesse pelos menos 2 mil. Meses mais tarde, quase cheguei lá com o salário da ZH.
Saudade da madrugada, chuva batendo, pingos realçados pelas luminárias na rua. Retrato de uma das minhas poucas felicidades.