A bronca da salada
A Estação Rodoviária de Porto Alegre, até os anos 1960, localizava-se em frente à atual, na esquina com a Júlio de Castilhos, um prédio acanhado, sempre com filas enormes e poucas bancas de lanches. Os táxis ficavam na Júlio e um fiscal entregava ao passageiro o prefixo e número de placa do carro, telefone e endereço para reclamações, um eficiente serviço que impedia que um coitado que vinha à Capital pela primeira vez fosse ludibriado pela corrida.
Cada vez que eu ia e vinha, calhava de estar com uma fome danada, e como o dinheiro era sempre mais curto que coice de porco, o remédio era comer – comer não, beber – uma salada de fruta. Digo fruta porque quase só tinha banana, vez que outra um pedacinho de laranja ou maçã. A fome vencia e eu comprava uma sempre antes de entrar no ônibus. Um dia, enchi o saco com esse arremedo de, sei lá como definir aquilo. Olhei o cara do balcão, um gorducho com bigodão, e estendi o dinheiro.
– Me dá uma salada de banana?
Pensei que o sujeito ia pular o balcão para me agredir. Ficou furioso, clamou em altos brados, todos pararam para ver a sua fúria. Quando ele tomou fôlego dei o segundo tiro de canhão.
– Mas ué! O que eu falei de errado? Não tem banana na sua salada?
A cara dele estava mais vermelha que interior de melancia. Um cidadão bem apessoado se aproximou e perguntou qual o motivo do barraco. Apontei para o vidro da salada.
– É por causa da salada de banana.
Pior que o cara do balcão ouviu. Saí de fininho.
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