O leitão quadrado
Nestes tempos sombrios de instabilidade econômica, vale lembrar o tempo do Plano Cruzado, em 1986. Começou “bem”, com o então presidente José Sarney congelando os preços, com ameaça de cana para quem aumentasse. Não tinha como dar certo, desde os tempos de Hamurabi que congelamento dá efeito contrário. Aconteceu o óbvio: os produtos sumiram das prateleiras. Doril, desabastecimento geral.
Na rua Santo Antônio, havia uma quitanda e minimercado do seu Wilson. Num domingo de manhã, auge do desabastecimento, chegou lá um sujeito baixote carregando uma mala retangular pequena de papelão. Vestia um terno tão apertado que, se espirrasse, o botão saltaria longe e poderia matar alguém no Cais do Porto. Pediu um Underberg com cana – cachaça sempre tinha, claro – e acompanhou os relatos tristes da turma “tão alegres que fomos e tão tristes que voltamos”.
– Nem carne de porco, encontro mais, imagina – lamentava um.
Ajeitando o nó da gravata, o gorducho entrou no papo.
– Bueno, um porquinho eu arrumo – falou. Leitão de primeira
Abriu a maleta. Dentro, havia um leitão quadrado de tanto ficar na maleta retangular. Pelo aspecto, e pelo cheiro, o finado suíno já havia passado desta para uma melhor há um bocado de tempo. Ninguém quis arriscar. O gordinho ainda veio com o argumento que os japoneses já vendiam melancia quadrada, então por que não leitão quadrado? Não colou.