O morro da assombração
Não me perguntem onde fica o Alegrete, meu segundo chão, minha terra adotiva, uma das tantas que meu infiel coração trouxe para perto se si. Vejo os meus parentes emprestados, da família da minha mulher, com quem tanto convivi. Os que lá estão e os que já se foram, tios e primos? Da janela do meu quarto olho em direção dos 240 graus da bússola, mas não importa. Sei que ela está lá, assim como sei que, olhando bem em frente, está lá a minha São Vendelino e meu querido arroio Forromeco.
Não a cidadezinha de hoje, mas a vila da minha infância. Éramos felizes então, eu. minha vila e meu arroio, onde só consegui pescar, imagina, um mísero lambari na saída da água que movia o moinho. Adiante da antiga igreja matriz, criminosamente demolida para dar lugar a um monstrengo sem alma, uns 10 ou 12 quilômetros acima, está um morro quadrado no topo, que, rezava a lenda contada pelos anciões em rodas à luz de lâmpadas Aladim, a luz que emanava daquelas estranhas e belas camisas como se tecidas por uma aranha luminosa, havia um lago que tinha até peixes, provavelmente trazidos pelas garras dos pássaros. As mulheres mais velhas diziam que era assombrado, em seguida faziam o sinal da cruz com a luz do medo em seus olhos repentinamente escuros. Chamava-se Morro do Diabo.
Eu não temia, nem na noite mais escura e tempestuosa com relâmpagos que fixavam sua imagem por segundos na retina, mas por décadas impressas no canto das minhas memórias inesquecíveis. Algum dia, pensava eu, algum dia, descobrirei porque a imagem daquele morro cristalizada por um relâmpago nunca abandonou meu arquivo fotográfico da vida como ela foi.
Descobri aos poucos. Ele domina os tempos que correm. Do seu topo quadrado, o diabo vela pelo Brasil.
É o seu reino predileto.